O ambiente jornalístico argentino está em chamas.
O motivo é uma confissão.
O jornalista Julio Blanck, editor chefe e colunista político do Clarín, admitiu, numa entrevista, que seu jornal praticou um “jornalismo de guerra” contra Cristina Kirchner. Ele acrescentou que isso não é “bom jornalismo”.
É um eufemismo.
É crime. “Jornalismo de guerra” é crime. Você torce as informações para favorecer seus interesses. Ilude o público.
Blanck diz que gostaria que o Clarín voltasse a ser a “consciência média” do argentino. Mas como? Credibilidade, uma vez perdida, adeus. É como virgindade. Ou inocência.
É tentador o paralelo com o que aconteceu no Brasil. A imprensa brasileira fez — ainda faz — um jornalismo de guerra contra Lula, Dilma e o PT.
Um antigo diretor de redação da Veja, pioneira no jornalismo de guerra, usou uma expressão mais suave. Ele falou em “jornalismo de exceção”.
É a mesma coisa, apenas atenuada. Regime de exceção, por exemplo, sempre foi um substitutivo para ditadura.
A diferença entre o caso argentino e o brasileiro foi a resposta dos atacados. Cristina entendeu que estava numa guerra, e guerreou de volta. Dilma, como Lula antes dela, respondeu com flores às bombas. Não exatamente flores, aliás: dinheiro. Dinheiro copioso. Bilhões de reais em publicidade.
Vistas as coisas, você entende o espírito maligno da plutocracia sulamericana. Compreende também por que um ex-presidente da Turquia disse desdenhoso, referindo-se ao golpe fracassado, que seu país não é igual às repúblicas da América do Sul.
(É nisso que os golpistas nos transformaram: num país ridicularizado mundialmente.)
De volta ao jornalismo.
Você admite métodos de guerra. Com isso, interfere diretamente na política e na democracia.
E nada de consequências?
Apenas como comparação. Na Inglaterra, tão logo o centenário tabloide News of the World reconheceu que invadia celulares regularmente em busca de furos, foi sumariamente fechado. Não restou ao dono, Murdoch, outra saída tal o clamor da opinião pública.
Mas no Brasil e na Argentina — e mais genericamente na América do Sul — as coisas são bem diferentes.
A plutocracia faz o que quiser para manter suas mamatas e privilégios, incluído aí o jornalismo de guerra das grandes empresas corporações de mídia.
E não acontece nada.
Os argentinos pelo menos deram um passo à frente em relação a nós. Confessaram, pelo editor chefe do Clarín, o antijornalismo que fizeram.
Nem isso ocorreu no Brasil.
Os donos da mídia fingem, cinicamente, que fazem jornalismo. Seus fâmulos — os comentaristas e colunistas — fazem a mesma coisa.
Mas sabemos todos que o que Globo, Veja, Folha e Estadão praticam está longe de ser jornalismo.
É, para roubar a expressão de Blanck, jornalismo de guerra.