Por Joaquim de Carvalho
Viralizou na internet o depoimento do médico Jorge Abissanra, oncologista que atendeu a Genival Inácio da Silva, o Vavá, até sua morte, na última quarta-feira.
É um depoimento que deveria cobrir de vergonha as autoridades que se empenharam em pareceres e decisões que resultaram na negação a Lula de um direito que não se nega a ninguém a 2 000 anos: velar os seus mortos.
Jorge contou que esteve no velório, em respeito ao paciente e à família dele, com quem conviveu nos últimos meses, e ficou na expectativa de que Lula pudesse estar presente e chorar a morte de Vavá. Disse ele:
— Fui talvez umas das primeiras pessoas a saber de seu falecimento e na hora me veio uma pergunta. E agora? Será que vão deixar Lula vir vê-lo? Não sabia como funcionava a legislação brasileira sobre o tema. Pois bem, fui atrás e descobri que só em 2018 185 mil presos saíram pra ir a enterro de parentes no Brasil. Isso mesmo, 185 mil. Como havia sido convidado pelo família, fui ao velório em respeito a meu paciente e sua filha e lá vi tamanha consternação de seu famoso irmão não estar presente. Me fica uma dúvida. Independente de minha opinião política sobre Lula e independente da de qualquer um, fiz meu papel de médico com o maior carinho, profissionalismo e dedicação possível. Não será que deveria também ser esse o papel do judiciário? Se 185 mil custodiados no último ano puderam participar de homenagens aos seus entes falecidos por que não Lula? Me amedronta quando a justiça parece não fazer justiça e soa como se estivesse fazendo vingança. Como médico e defensor da vida não podia deixar de fazer esse relato. A lei e pra todos.
Doutor Jorginho, como é conhecido, viu de perto que Vavá não é nem de longe o que a velha imprensa descreveu, 2005, auge do mensalão, como um grande lobista dos negócios do governo. Afirmou:
— Nesses últimos dias tive um paciente ilustre, seu Genival Inácio da Silva, o Vavá, irmão de Lula. O atendia no SUS, senhor sempre simpático, com vestes simples, humilde e acompanhado sempre de sua adorável filha Andreia. Ele nunca me disse que era irmão do ex-presidente mas todos obviamente sabíamos. Já muito debilitado pela doença avançada, sem uma das pernas amputadas pela câncer, Vavá parecia dar de ombros pela situação que o acometia. Sempre tinha um sorriso no rosto e um olhar alegre pra transmitir.
Em 2005, quando Vavá foi apresentado pela Veja como lobista de grandes negócios no governo, eu trabalhava na equipe de Boris Casoy no Jornal da Record e fui escalado para a reportagem de repercussão da “denúncia” da revista.
Ao chegar na casa de Vavá, vi que não fazia sentido a notícia de que ele era um grande lobista. Era um imóvel simples, num bairro pobre de São Bernardo do Campo, e aquela notícia não fazia sentido.
Logo depois, a denúncia da revista caiu no esquecimento, como tantas outras feitas para desgastar Lula e o seu governo.
Jorge Abissanra é médico experiente e é de uma família de políticos, nenhum deles ligado ao PT.
Seu pai foi prefeito de Ferraz de Vasconcelos pelo PSB, e ele chegou a ser candidato a vice-prefeito de Suzano em 2016, também pelo PSB.
Num momento de desgaste do PT, com Lula preso, politicamente talvez fosse melhor para Jorge Abissanra silenciar, como tantas outras pessoas em posição de destaque fazem neste momento.
Mas, segundo ele, moralmente não seria possível:
— Como médico e defensor da vida não podia deixar de fazer esse relato. A lei e pra todos.
A Lei É para Todos… Muito mais que um título de filme, que uma peça de propagada destinada a manipular o povo.
Com seu relato, Jorge Abissanra foi correto e não se acovardou, e isso não é pouca coisa no Brasil de hoje.