O dia em que O Globo matou Ariano Suassuna

Atualizado em 23 de julho de 2014 às 2:04
Ariano Suassuna
Ariano Suassuna

 

A passagem é manjada, mas deliciosa. Em 1897, um jornalista foi destacado para saber da saúde do escritor Mark Twain, que estaria debilitada. Twain recebeu o repórter e explicou a situação. Na verdade, quem estava nas últimas era seu primo.

Em seguida, contou a história no extinto New York Journal, num artigo que incluía uma frase hoje clássica: “As notícias da minha morte foram exageradas”. A citação seria usada, depois, por meio mundo, nas situações mais diferentes, eventualmente com variações.

No afã de dar o furo sobre a morte de Ariano Suassuna, internado no Recife por causa de um AVC hemorrágico, o Globo resolveu dar cabo do escritor.

O colunista Ancelmo Gois publicou em seu blog: “A Academia Brasileira de Letras acaba de informar que morreu o acadêmico Ariano Suassuna, 87 anos”.  Ciente da barrigada, Ancelmo saiu-se com uma conversa de que a ABL “voltou atrás”.

Nesse intervalo, a nota de Ancelmo andou, como diz um amigo, como uma égua. Tempo suficiente para Ricardo Noblat dar sua parcela de contribuição ao debate.

Não se sabe de onde, nem por quê, Noblat cravou: “É uma questão de horas a morte do escritor Ariano Suassuna, vítima, ontem, de um AVC, operado às pressas no Recife. Lamento mutíssimo [sic].”

Não, Noblat não tem nenhuma fonte que lhe passou a informação quentíssima e consta que não possui poderes mediúnicos. É apenas um chute pretensamente esperto.

Ora, o estado de Suassuna é gravíssimo. Está por questão de horas — como nós, aliás. Se duas ou 20, Noblat não faz ideia. Em todo caso, ele já lamenta muitíssimo. No médio ou longo prazos, ele acerta e sai cantando: “Eu não avisei, eu não avisei?”

Virou piada, é claro. Alguém, maldosamente, disse que no Globo a morte cerebral de Noblat já é dada como certa; outro lhe perguntou, via redes sociais, se vai chover amanhã.

Há poucos meses, as “fontes” de Noblat lhe garantiram que Lula seria candidato no lugar de Dilma. Era batata. Diante dos fatos, não se retratou, não explicou, nada. Pra quê? Dane-se a realidade.

O Globo, entre outras coisas, é o mesmo jornal que deu uma entrevista fantástica de Mario Sergio Conti com o sósia de Felipão e que, dias antes da Copa, perpetrou um editorial apocalíptico declarando que o caos era inevitável e “o jogo estava perdido”.

Neste momento, Suassuna está em coma e respira com ajuda de aparelhos. Ele teria material para uma história incrível, entre o pândego e o patético, sobre a decretação antecipada de seu falecimento. Mark Twain já aconselhou: “Apure os fatos, primeiro, e então você pode distorcê-los o quanto quiser”.