O dia em que torci por Jesus. Por Fernando Brito

Atualizado em 23 de novembro de 2019 às 23:19
Jorge Jesus. Foto: Divulgação

Publicado originalmente no Tijolaço:

POR FERNANDO BRITO

Tricolor desde criança, dos tempos em que saía de cor o “Félix, Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antônio…” da Taça de Prata de 1970, a vida inteira foi, claro, “secar” o Flamengo .

Desta vez, porém, aboli a tradição de meio século e desejei – torcer já seria hipocrisia dizer – a vitória flamenguista.

Muito por causa de Jesus – o Jorge, não o Nazareno – que, bom português, nos fez ver no futebol de novo o espírito do lendário Gentil Cardoso, do qual o João Saldanha, felizmente apropriou-se naqueles anos 70: o de “correr atrás da bola como quem corre atrás de um prato de comida”.

Hoje cedo, quando falei disso, uma pessoa disse que tinha ficado surpresa como, na vitória por 5 a 0 sobre o Grêmio, tinha ficado espantada como ele, com este placar, continuava transtornado, estimulando o time flamenguista e lembrei-me da abulia do Felipão no meio do desastre do 7 a 1 para a Alemanha.

O fato é que cedemos todos a este clima, inclusive alguns amigos botafoguenses

Vinha a tarde modorrenta, em que a ameaça de chuva refrescava o sábado de sol e preguiçoso, meu filho de 14 anos – que já torceu para dois ou três times – não queria ir para a rua num destes botequins de calçada – assistir o jogo.

Enchi-lhe o saco até que foi, no finzinho do primeiro tempo, submetido ao que acho que ser meu dever de pai de acostumá-lo e aproximá-lo do sentimento coletivo, fosse triste ou alegre.

Só isso nos tira do plano mesquinho do indivíduo e nos faz dar-nos, generosamente, ao sentimento coletivo.

Que, claro, o empolgou, mesmo quando aos 42 minutos, o jogo e o sonho pareciam perdidos.

E não estavam, como ensinava a filosofia do Chacrinha, ao dizer que “o programa só acaba quando termina”.

Não importa que, amanhã, o finório Bolsonaro, que é Botafogo, vá fazer demagogia de camisa do Flamengo.

Não cola…

Foi um dia de alegria – e de inesperada superação – para a maioria dos brasileiros, que não precisam ser flamenguistas para desejar a felicidade de seus irmãos, embora possam – e até devam – ter suas rixas domésticas.

Quando um povo festeja, não odeia.

Um dia, Leonardo Boff escreveu que “a festa é o tempo forte da vida, onde os homens dizem sim a todas as coisas”.

Pois é, um povo alegre nunca é mau.