O dinheiro e o prestígio de Ludmilla não a puseram a salvo do racismo. Por Nathali Macedo

Atualizado em 18 de janeiro de 2017 às 14:47
Ludmilla
Ludmilla

 

Um apresentador da Record Marcão Chumbo Grosso (???) xingou a cantora Ludmilla de macaca ao vivo em seu programa, o Balanço Geral, do Distrito Federal, conhecido por suas matérias relevantes, sensatas e nada sensacionalistas.

É patético, no mínimo, pensar que estamos em 2017 e evoluímos tão pouco que ainda temos que assistir a um homem que atende pela alcunha de Marcão Chumbo Grosso xingar uma mulher negra ao vivo em cores. Marcão acabou demitido por causa da repercussão.

Ou a vida, às vezes, faz questão de ser irônica, ou o racismo institucionalizado é tão devastador que produz negros que não se reconhecem como negros, e reproduzem contra outros negros as opressões racistas que são suas velhas conhecidas.

É exatamente como ver mulheres anti-feministas: a sensação de que a cultura dominante fez bem o seu trabalho.

É mais patético ainda (e um pouco angustiante) pensar que um apresentador – convenhamos – medíocre pensa ter o direito de xingar uma mulher negra em um programa medíocre.

E que essa mulher é uma das dez cantoras mais bem pagas do país na atualidade, junto com outras como Anitta e Karol Conka (que os sabichões da alta cultura consideram lixo).

O simples fato de “ser homem”, quero dizer, tem legitimado tantas coisas absurdas e há tanto tempo, que sequer a questão de classe foi preponderante para desencorajar a injúria racista, o que me faz acreditar em uma certa hierarquia de opressões: a opressão de classe não é capaz de conter a opressão de raça, e nenhuma delas é capaz de conter a milenar opressão de gênero.

Se nem o dinheiro nem o prestígio social puseram Ludmilla a salvo do racismo institucionalizado, imaginemos o quão chocante seria se as histórias das mulheres negras e periféricas – que vivem a intersecção de todas as opressões (gênero, classe e raça) – passassem na televisão.

Não passarão.