Um dos principais desafios do presidente Michel Temer – na realidade um compromisso que o interino selou com o setor produtivo em troca do apoio à derrubada da presidente Dilma Rousseff – é a aprovação da reforma da previdência.
Para pressionar os trabalhadores a contribuírem por mais tempo, Temer quer alterar o cálculo da aposentadoria, através da instituição de uma idade mínima – 65 anos tanto para homens quanto para mulheres.
Outra mudança será o tempo de contribuição obrigatório para que qualquer um se aposente – dos 15 atuais para 20 anos. Também é consenso que a vinculação do piso previdenciário ao reajuste do salário mínimo será revista, mas ainda não se sabe se isso será feito junto com a reforma ou em uma outra proposta, dada a polêmica da questão.
Conversei sobre o assunto com Quintino Severo, secretário de administração e finanças da CUT e representante da Central Sindical no Conselho Nacional de Previdência.
Como era de esperar, Quintino está preocupado com o que tem lido nos jornais.
“O que se tem falado representa um ataque frontal aos direitos do trabalhador, penalizando justamente os mais pobres”, diz o dirigente. “Veja o caso da idade mínima: em geral os mais pobres começam a trabalhar aos 15 anos, enquanto a parcela mais rica começa aos 25 ou mais. É justo que todos se aposentem aos 65?”, pergunta.
Na reforma imaginada por Temer, e anunciada à conta gotas através dos colunistas amigos, todos os que tiverem menos de 49 anos serão atingidos.
Quem tiver 50 anos ou mais e ainda for profissionalmente ativo terá que acrescentar 50% do tempo, ou seja, se faltarem cinco anos para a pessoa se aposentar, ela terá que acrescentar 2,5 anos a esse período.
A principal justificativa para a reforma é que, dentro de algumas décadas, o número de contribuintes irá diminuir, enquanto o de idosos irá triplicar. Mas para o dirigente da CUT o foco do debate deveria ser outro.
“Para justificar o corte, o governo insiste em focar só a previdência, quando o correto é falarmos em ‘seguridade’, que envolve saúde, previdência e assistência social”, diz Quintino, para quem o déficit do setor é outra falácia. “O governo contabiliza na conta da previdência, e não no tesouro, as isenções das entidades filantrópicas e as despesas com os trabalhadores rurais”.
De acordo com o IBGE, em 2060, a população brasileira terá 60% de pessoas em idade ativa profissionalmente, enquanto as que possuem mais de 65 anos representarão 27%. No Brasil, a idade média das aposentadorias concedidas a homens em 2015 foi de 59,4 anos.
Atualmente, uma pessoa pode se aposentar por idade ou por tempo de contribuição.
No primeiro modelo, os homens precisam ter 65 anos e as mulheres, 60 anos, além de terem no mínimo 15 anos de contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O benefício é calculado a partir da média de 80% dos maiores salários que o contribuinte recebeu.
Já no segundo modelo, pelo tempo de contribuição, os homens precisam ter contribuído por 35 anos e as mulheres, por 30 anos.
O benefício também é calculado a partir da média dos 80% maiores salários, mas com a diferença de que este valor é multiplicado pelo fator previdenciário.
O fator previdenciário, criado em 1999, é um número que resulta de uma fórmula que leva em conta tempo de contribuição, idade do contribuinte no momento da aposentadoria e a expectativa de vida, além de uma alíquota fixa. O fator visa diminuir o valor final do benefício e impedir que o trabalhador se aposente cedo demais.
Em 2015, Dilma Rousseff sancionou um projeto de lei criando uma nova forma de se calcular a aposentadoria, a fórmula 85/95. Os números 85 e 95 representam a soma da idade da pessoa e do tempo de contribuição para mulheres e homens, respectivamente.
Por exemplo, se uma mulher possui 55 anos e contribuiu por 30 anos, essa soma dá 85 e, portanto, ela pode se aposentar.
Esses números são válidos até 2018 e irão aumentando de acordo com a expectativa de vida do brasileiro, até chegar em 2027, quando estes números serão 90/100.
O presidente interino está aguardando o desfecho do processo de impeachment para cumprir seu acordo com o setor produtivo e enviar a proposta ao Congresso. Temer espera que a reforma, que atingirá 80% dos brasileiros, seja aprovada em 2017.
“Por enquanto, o que temos são informações esparsas transmitidas pela imprensa”, diz o dirigente da CUT, lembrando que, entre essas informações, constam também a reforma da CLT, visando acabar com o 13º salário, e a livre negociação entre patrões e empregados sem passar pela em vigor – uma iniciativa tentada sem sucesso no governo de FHC.
“É a forma clássica que a classe dominante encontra para evitar a distribuição de renda no país”, diz Quintino Severo. “O que Temer está tentado reimplantar é o que eles sempre fizeram, não há surpresa nenhuma”.
Segundo Quintino Severo, enquanto aguarda uma definição, a CUT conversa com outras Centrais Sindicais e já tem uma posição fechada de não aceitar qualquer ataque aos direitos sociais e trabalhistas. O chamamento da greve geral, caso o governo insista na reforma como está sendo anunciada, é uma das alternativas de resistência.