O Ministério da Justiça não é o único a confundir escravidão com imigração. Por Marcos Sacramento

Atualizado em 19 de outubro de 2015 às 7:49

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A forma como uma campanha publicitária do Ministério da Justiça redefiniu a escravidão brasileira, colocando a diáspora africana no mesmo nível das levas de imigrantes que chegaram voluntariamente ao Brasil, mostra como a escravidão está longe de ser considerada uma ferida aberta na história do país.

Criada em apoio aos refugiados e contra a xenofobia, a campanha tem como tema “Eu Também Sou Imigrante ” e mostra diversas pessoas informando as suas ascendências. A polêmica ficou por conta da foto de um jovem negro sorridente e com os dizeres “Meu avô é angolano, meu bisavô é ganês. Brasil. A imigração está no nosso sangue”.

A peça pecou ao sugerir que a chegada de mais de 4 milhões de negros para servir como escravos tenha sido semelhante às imigrações de europeus e asiáticos, vindos para trabalhar livremente.

Nada disso teria acontecido se a escravidão fosse tratada com a solenidade que o fato histórico exige. Ela provocou sofrimentos  na forma de estupros, mutilações, torturas, infanticídios e tantas outras crueldades, mas fora dos círculos da militância negra raramente é vista como uma tragédia.

Como consequência desta visão distorcida, vez ou outra surgem gafes como a estátua de um escravo acorrentado instalada em um supermercado do grupo Pão de Açúcar ou quadros de humor duvidoso com o exibido no programa “Tá No Ar”, da Globo, no qual fizeram piada com uma promoção de escravos nas  lojas “Escravas Bahia”.

Se a escravidão fosse uma ferida aberta, uma página incômoda na história do país, não existiriam milhares de hotéis e pousadas com o nome de “senzala”. Até motel existe, como um em Porto Alegre com suítes batizadas de “Alforria”, “Pelourinho” e “Grilhões”.

Mesmo com as mudanças promovidas pelo governo a partir de 2003, como a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), aprovação da Lei 11.645 (ensino de história afrobrasileira  e indígena nas escolas) e  implantação de cotas nas universidades e nos concursos públicos federais, desconstruir décadas de negação do racismo e demais problemas da escravidão é uma tarefa hercúlea.

O duro é ver uma instituição do porte do Ministério da Justiça se comportando como os empresários desprovidos de bom senso e conhecimento histórico, que usam a escravidão para inspirar seus empreendimentos de mau gosto.