Há tragédias que capturam um tempo.
O incêndio do dirigível Hindenburg, em 1937, orgulho da Alemanha, foi uma derrota emblemática do nazismo.
Nós tivemos o fogo no edifício Joelma nos anos 70 e, mais recentemente, as catástrofes de Mariana e Brumadinho.
O Ninho do Urubu, no Rio de Janeiro, foi destruído nesta madrugada.
Nada mais brasileiro que o Flamengo e que o Rio, uma espécie de umbigo nacional, que já vinha penando sob chuvas torrenciais que, como sempre, devastaram gente pobre.
Os jovens atletas que estão entre os dez mortos tentavam estourar como seus ídolos.
Estavam num alojamento com telhado de zinco, precário e perigoso.
Como valiam pouco no mercado milionário do futebol, suas vidas não valiam nada.
O goleiro Christian Esmerio Candido, 15 anos, é a primeira vítima com identidade.
Um país abandonado, vítima do descaso do estado e da iniciativa privada, jogado às traças — e, o pior, sem esperança.
É difícil lembrar de uma época tão funesta da nossa história, com um presidente cujo grande talento é semear o ódio tendo sua intimidade devassada pelo filho no hospital onde se recupera.
Não há comando, não temos para onde olhar, para quem apelar. Onde buscar fé.
Não me refiro, obviamente, à fé de aluguel das damares, dos felicianos, dos magnos maltas, do lixo evangélico mercador, mas à capacidade de sonhar com um país menos canalha.
Viramos zumbis numa paródia de George Romero, uma distopia em que os flagelos se sucedem sem que possamos esboçar reação porque estamos com o espírito quebrado.
Pobres meninos. Pobres de nós. O que nos tornamos?
O Ninho do Urubu é o Brasil.