Dois episódios hoje dão conta do projeto de barbárie em curso no Brasil. Na Folha de S. Paulo, a economista-chefe da Agência de ARX, Solange Srou, escreveu que quem ganha salário mínimo no Brasil não é pobre.
Se não é pobre, seria de classe média? Se é, qual a diferença salarial dela em relação a quem ganha menos de R$ 998,00 por mês.
Solange, que seguramente não ganha menos de R$ 50 mil por mês, viveria com com um salário 50 vezes menor? Afinal, ela também é classe média
Ambos não seriam pobres.
Outro episódio que revela a barbárie é da lavra de Jair Bolsonaro. Ele anunciou um projeto de lei que amplia o conceito de excludente de ilicitude, para garantir a impunidade a policiais e militares das Forças Armadas que participarem de operações de Garantia da Lei e da Ordem.
Bolsonaro tenta implantar no Brasil, via projeto de lei, um expediente legal que, se aprovado, terá o mesmo efeito de um decreto da presidente autoproclamada da Bolívia, Jeanine Áñez.
Lá, para sufocar a resistência ao golpe de estado, ela deu aos militares uma espécie de licença para matar.
Até ontem, já havia na Bolívia 32 mortos e centenas de feridos, muitos em estado grave.
Nenhuma das vítimas estava armada.
Com o decreto, Bolsonaro se antecipa a protestos que, na atual conjuntura de retirada de direitos, serão inevitáveis.
Para aprovar seu projeto de lei, o presidente fez uma chantagem: Se o o Congresso Nacional não aprovar a matéria, o governo federal não assinará mais decretos de GLO em caso de necessidade dos estados.
Cada um se defenderá por conta própria.
Entre o artigo da gestora de investimentos e o projeto de lei de Bolsonaro, há um ponto em comum: a subversão de conceitos do que seria pobreza e do que seria o direito do cidadão à segurança.
Em outras palavras, se alguém ganha o que, matematicamente, não é suficiente para sua subsistência, não deve reclamar, já que pobre não seria.
E se reclamar, com protestos legítimos, a resposta seria dada como na Bolívia: balas na cabeça.
É um cenário que já se desenhava desde a eleição do ano passado. Dois projetos estavam em disputa: o da barbárie, representado por Bolsonaro, e o da civilização, no segundo turno representado por Fernando Haddad.
Venceu o da barbárie, e agora formadores de opinião e especuladores financeiros, como Solange Srou, criam o ambiente cultural para legitimar a violência desmedida do estado.
Afinal, quem ganha salário mínimo (pouco mais de 200 dólares) não seria pobre, na visão da economista que garante o rentismo no Brasil.
Reclamar por quê? Diria ela.
Os agentes da repressão teriam assim a licença para matar com a qual a Bolívia tentar avançar no projeto racista e antissocial em curso na Bolívia.
Não é muito diferente da situação no Brasil.
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