O que muda após decisão do STF sobre banco tomar imóveis com dívidas sem decisão da Justiça

Atualizado em 27 de outubro de 2023 às 10:19
Medida pode causar impacto no financiamento de imóveis. (Foto: Reprodução)

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, em casos de atraso no pagamento de financiamento imobiliário, os bancos e outras instituições financeiras podem retomar o imóvel dado como garantia sem a necessidade de uma decisão judicial. Essa decisão, fundamentada na lei que trata da alienação fiduciária, tem potencial para reduzir os riscos para os bancos e, possivelmente, diminuir o custo do crédito.

Oito ministros votaram a favor da manutenção da regra atual, enquanto dois foram contrários. A discussão girou em torno de uma lei de 1997 que estabeleceu a alienação fiduciária, um sistema no qual o próprio imóvel em processo de aquisição é oferecido como garantia.

Essa lei prevê que, em caso de não pagamento, a instituição credora pode realizar uma execução extrajudicial e retomar o imóvel. O procedimento é conduzido por meio de um cartório e não requer intervenção do Judiciário. O STF agora validou essa regra para todos os casos, eliminando a necessidade de recorrer à Justiça.

Garantia Prevista no Contrato

A decisão do STF se aplica ao modelo de contrato de alienação fiduciária, independentemente do tipo de imóvel envolvido, seja uma casa, apartamento, loja ou galpão, por exemplo. Nesse modelo, o imóvel financiado funciona como garantia para o banco. Em caso de inadimplência, o banco tem o direito de executar a garantia e tomar posse do imóvel por meio de um processo simples que não requer uma decisão judicial.

De acordo com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a alienação fiduciária está presente em cerca de 99% dos 7,8 milhões de contratos de financiamento imobiliário ativos no Brasil a partir de agosto deste ano.

Ao longo do processo, a Febraban também apresentou um estudo da LCA Consultoria que indicava uma taxa de inadimplência de 1,7% em contratos fechados por meio de alienação fiduciária. Em comunicado, a entidade acredita que a decisão resultará em “um aumento no volume de financiamento imobiliário e no fomento do setor da construção civil.”

O ministro Luiz Fux. (Foto: Reprodução)

No início do julgamento, realizado na quarta-feira (25), o Ministro Fux concordou com os argumentos de que o modelo atual contribuiu para a redução dos custos no setor.

“A exigência de judicialização da execução dos contratos de mútuo com alienação fiduciária de imóveis iria contra os avanços e melhorias no arcabouço legal do mercado de crédito imobiliário, que contribuíram significativamente para o crescimento do setor e a redução dos riscos e custos”, afirmou.

Instituições como o Banco Central do Brasil, a Febraban e a Defensoria Pública da União participaram do julgamento como Amicus curiae (amigos da corte) e apresentaram argumentos para auxiliar os ministros na decisão.

Imóvel Tomado em Apenas 5% dos Casos

Gustavo César Mourão, advogado que falou em nome da Febraban, afirmou que a alienação fiduciária causou uma “revolução” no mercado de crédito imobiliário e destacou que a execução extrajudicial é necessária em apenas 5% dos casos de inadimplência.

“Nos outros 95% dos processos que são iniciados, há a solução da inadimplência pela purgação da mora e pela definitiva aquisição de imóvel pelo tomador”, ressaltou.

Por outro lado, o defensor público federal Gustavo Zortéa da Silva argumentou que há uma violação do direito ao devido processo legal, por parte do devedor. Para Olivar Vitale, sócio do VBD Advogados, a decisão priorizou uma maior segurança para o financiamento imobiliário.

“O STF prestigiou a segurança jurídica. Dessa forma, o crédito imobiliário no Brasil está preservado, permitindo que os cidadãos tenham acesso à moradia e à tão esperada redução do déficit habitacional no país”, disse Vitale.

Ana Carolina Osório, membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB/DF, acredita que o Judiciário pode ser acionado se algum dos requisitos legais estabelecidos na lei não forem cumpridos.

“A lei estabelece uma série de requisitos que precisam ser atendidos, sob pena de nulidade do procedimento de execução do contrato. Nesse sentido, a lei não é inconstitucional, uma vez que o Judiciário pode ser acionado se os requisitos legais na execução do contrato não forem atendidos”, afirmou.

Processo Mais Rápido

João Quinelato, professor de Direito Civil do IBMEC, explicou que a lei já previa o mecanismo de retomada extrajudicial dos imóveis. Ele acredita que a decisão impactará todo o mercado imobiliário, tornando o financiamento mais econômico.

“A decisão vai impactar o mercado imobiliário inteiro. É uma ferramenta bem vista e deve reduzir os custos, na medida em que os bancos, em caso de inadimplência, não vão precisar recorrer à Justiça. Isso deixa todo o cálculo do financiamento mais barato, porque o processo vai ser mais rápido, as instituições financeiras não vão precisar pagar despesas judiciais, além de não sobrecarregar o judiciário”, declarou.

Quinelato também destacou que é necessário aguardar a decisão final do julgamento para compreender, por exemplo, se o STF estabelecerá alguma regra específica.

“É necessário aguardar a decisão final do julgamento para entender, por exemplo, se alguma regra será determinada pelo STF”, disse.

Arthur Groke, do escritório Advocacia Riedel, por sua vez, destacou que a lei em questão está em vigor desde 1997. Ele entende que a decisão não exclui a possibilidade de recorrer ao Judiciário em caso de abusos.

“O que o STF julgou não é que isso não pode ser discutido judicialmente, mas que não há nenhum problema nesse processo ser feito extrajudicialmente, por meio de cartório. No entanto, se o consumidor entender que há algum problema, inclusive na execução, como questões contratuais, ele tem todo o direito de questionar na Justiça”, declarou.

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