Os moradores do Morumbi que se manifestaram no último sábado a favor da ação policial que matou o menino Ítalo Ferreira de Jesus Siqueira, de 10 anos, precisam lembrar que poderão ser vítimas do próprio ódio que instigam.
Ao louvar uma ocorrência com indícios robustos de execução, essas pessoas reforçam na polícia o pensamento de que “bandido bom é bandido morto” e a doutrina do uso da arma de fogo como o único em vez de último recurso a ser utilizado no combate ao crime.
Conforme o ouvidor das polícias de São Paulo, Júlio César Fernandes Neves, explicou em depoimento à CPI dos Assassinatos de Jovens, “essa fatia dos brasileiros que ‘defende o bandido morto’ fomenta a letalidade das corporações policiais. Essas pessoas estariam autorizando o mau policial a fazer justiça com as próprias mãos. Esse tipo de anuência induz o mau policial a cometer o maior erro da sua vida”.
Segundo a CPI, 3.022 pessoas foram mortas em supostos conflitos com policiais civis e militares no ano de 2014. A maioria das vítimas são jovens negros do sexo masculino e as mortes foram enquadradas nos chamados “autos de resistência”, grande parte deles arquivados sem uma investigação aprofundada e punição aos policiais envolvidos.
Esses dados não sensibilizam quem aceita a morte de uma criança em perseguição policial sem se dar ao trabalho de questionar quais razões empurram crianças cada vez mais novas em direção ao crime.
Porém eles deve ficar alertas de que parabenizar a PM por trocar tiros com “vagabundos”, como eles gostam de falar, não os torna imunes à truculência que idolatram.
“Cidadãos de bem” também cometem equívocos como fugir de uma blitz de trânsito por estar com os documentos atrasados, por exemplo, e numa situação dessas podem ser agraciados com tiros disparados por seus heróis fardados.
Quem defende a lógica do “disparar antes e perguntar depois” e não dá a mínima para os direitos dos pobres de pele escura precisa ao menos pensar nos próprios filhos, pois não é raro um inocente ser fuzilado pela polícia por causa de pequenas transgressões.
O caso mais recente aconteceu dias atrás em Ourinhos, cidade do interior de São Paulo. Brian Cristian Bueno da Silva, 22 anos, morreu com um tiro no pescoço após o carro em que trafegava ser interceptado por uma viatura da PM, sob acusação de transitar em zigue-zague para derrubar cones de sinalização.
O rapaz era branco, trabalhava e a princípio não tinha envolvimento com atividades criminosas. Pelo perfil divulgado na imprensa, poderia muito bem ser filho daqueles que aplaudiram a morte do pequeno Ítalo.