O sexo pode ser a mais sublime e a mais destruidora manifestação do desespero. Um homem desesperado agarra-se ao sexo como alguém que procura, perplexo e assustado, proteção num temporal repentino. Uma mulher desesperada faz o mesmo. Quando a gente olha para as coisas e não vê sentido, e se pergunta por que, por que, por que, o sexo quase sempre aparece como uma resposta formidável, irresistível. E poderosamente ilusória. O sexo é a esperança de vida. O sexo é a esperança de ressurreição vitoriosa de um caso de amor derrotado. O sexo pode ser um anestésico de curta mas intensa duração para as dores da alma.
Naqueles minutos em que os corpos estão engalfinhados, o desespero cede à trégua. A aflição como que descansa. Aquela volúpia tão fugaz, aquele êxtase precário por natureza, aquele fragor destinado em breve ao silêncio enfastiado, todas essas coisas parecem por um momento capazes da eternidade. O bêbado de desespero é o bêbedo de sexo. A pena é que a aflição dure tão mais que o prazer. A angústia é, paradoxalmente, libidinosa. Deus, quantas bobagens sexuais não cometemos movidos pelo desespero, quantos passos desastrados, quantas escolhas erradas, quantos abismos mascarados. Quanta dor imposta e recebida em meio a gemidos de êxtase.
O homem sereno, cuja mente não seja tagarela, não é tragado pelo abismo sexual. O homem sereno não se agasta contra as circunstâncias. O homem sereno aceita as coisas como elas são. O homem sereno comanda a mente em vez de ser comandado por ela. O homem sereno não se importa nem com o louvor, nem com a critica. O homem sereno não se perturba diante do fracasso, nem diante do sucesso. O homem sereno não se deixa levar pelos delirantes arroubos do ego. O homem sereno não é grande senão por saber que é pequeno, não é sábio senão por saber que não se sabe nada. O homem sereno prefere jogar uma partida de buraco a se meter numa aventura sexual complicada com a mulher mais gostosa e mais neurótica do bairro. O problema é que não existem homens serenos. E muito menos mulheres. O que existe é a serenidade. Mas, como as velhas escrituras tão bem registram, é mais difícil conquistar a serenidade do que conquistar o mundo.
É preciso reflexão, perseverança, paciência, fé e todos aqueles atributos que parece que quanto mais perseguimos, mais distantes ficam.
Você. Eu. Nós dois. Foi o desespero que nos uniu, disfarçado em amor. (Mas, Deus que disfarce, que disfarce.) Um escritor barato, uma dançarina de boate tão linda e tão pequena e tão desvairada que eu diria que foi a musa que inspirou Tiny Dancer. “Hold me closer, tiny dancer…” E no entanto tão grande no palco daquela boate decadente do centro da cidade. A falta de perspectiva de nós dois criou a ilusão do horizonte para ambos. Dois perdedores que juntos pareciam um vitorioso. Seus olhos tão tristes, mas fumegantemente vivazes e alegres perante os olhares ávidos e rudes dos homens da platéia. Outros homens devem guardar lembranças bem mais concretas de você. Talvez os seios, talvez a tatuagem de golfinho tão bem localizada. Ou até o feijão com pouco sal. Mas, quanto a mim, a parte que mais me agrada lembrar são os olhos. Foi o desespero que nos uniu, majestosa dançarina barata. E foi o desespero que nos desuniu.