Muita gente progressista teve um surto de esperança quando a Folha publicou um editorial contra Eduardo Cunha.
Teria a Folha recobrado alguma coisa dos anos 1980, quando captou o espírito do tempo e se tornou o maior jornal do país?
Ri sozinho.
Sabia que aquele texto fazia parte da cota da Folha para manter a ilusão, para os crentes, de que é plural.
Passados poucos dias, a manchete de hoje com um Datafolha que põe Lula – sempre ele – atrás de Aécio é a confirmação de que a Folha continua a ser o que é faz muitos anos, um jornal conservador empenhado em devolver os amigos ao poder.
Editorialmente, é um disparate fazer uma pesquisa daquelas quando sequer se passaram seis meses das eleições que deram um segundo mandato a Dilma.
Há uma frase primorosa de Keynes que se aplica a este tipo de futurologia obtusa: “A longo prazo estaremos todos mortos”.
O próximo passo poderia ser especular sobre as eleições de 2022.
Lula não exerce cargo executivo e não fala com a mídia. Só aparece nela quando se trata de associá-lo a uma sucessão infindável de “escândalos”.
Também é grande o espaço que dão a ele para tecer prognósticos sinistros sobre sua saúde.
Um colunista do UOL, não faz muito tempo, disse que Lula estava com câncer no pâncreas.
Veio o desmentido, e ele insistiu. Não aconteceu nada com ele: continua com sua coluna no UOL. E qualquer pessoa com o mínimo de familiaridade com câncer no pâncreas sabe que, se fosse verdade, Lula já estaria morto neste momento em que escrevo.
Lula é massacrado o tempo todo.
Mesmo assim, aparece com 25% das intenções de voto na esdrúxula pesquisa Datafolha.
Aécio tem 10 pontos mais, ele que recebe uma cobertura de herói em jornais e revistas, e que acabou de disputar uma eleição.
O imenso lado b de Aécio simplesmente não existe para a imprensa. Seu afilhado Anastasia apareceu na lista de Janot, mas isso sumiu do noticiário faz tempo, assim como o helicoca de seu amigo Perrela e o vergonhoso aeroporto de Cláudio.
Agora mesmo.
O retumbante fracasso de sua expedição bolivariana foi tratado como um caso de sucesso por um colunista do UOL, Josias de Souza.
A cobertura dada a Aécio – complacente, generosa, amiga – é o exato oposto daquilo que se faz com Lula.
Homenagens internacionais a Lula jamais são noticiadas – o que levou o equilibrado jornalista Xico Sá, que deixou a Folha incomodado com a política editorial do jornal, a classificar o comportamento da mídia com uma palavra próxima de canalha.
Estes os fatos.
Aécio deveria ter muito mais que 35% se não fosse um político tão fraco. E Lula deveria ter bem menos que 25% se não fosse amado por aqueles que a mídia abomina – agrupados numa coisa chamada povo.