O xadrez dos “factoides”. Por Fernando Brito

Atualizado em 28 de janeiro de 2019 às 20:36
Jair Bolsonaro e General Hamilton Mourão. Foto: Marcello Casal/Agência Brasil

Publicado originalmente no Tijolaço

POR FERNANDO BRITO

Um governo sem propostas políticas tem, necessariamente, de apelar para os chamados “factoides”.

Tudo, no governo Bolsonaro, a esta altura a completar um mês, tem sido isso.

Se você colocar estes 28 dias na peneira, o que fica, além das declarações imbecis de gente guindada à posição de ministro sem que tivesse condições mínimas – nem mesmo a mais básica para quem é insuficiente –   para o cargos: a capacidade de ficar em silêncio?

Bem, houve o decreto das armas, como disse o General Mourão, uma medida que não foi de segurança pública, mas “para cumprir uma promessa aos eleitores”.

O fiasco da ida a Davos, onde iria brilhar e apenas teve um desempenho à sua altura: pífio.

Agora, essa inacreditável pantomima de deixar os nossos militares fora das ações de emergência em Brumadinho para fazer cenário para os ‘ultramodernos” israelenses que, afinal, podem ter boas intenções mas nenhum equipamento milagroso, ainda que estejam sendo pajeados pelo Exército e pelos Bombeiros para atuarem no lugar onde todos sabem que há mais corpos: o malsinado refeitório onde mais de 100 pessoas foram colhidas pela lama.

No mais, algumas ideias mal explicadas, como a redução do Imposto de Renda das empresas e a tributação de lucros e dividendos e a reforma da previdência, da qual muito se fala e quase nada se mostra.

Mesmo que este governo não tivesse sido atropelado pelos mal feitos e promiscuidades milicianas do motorista Fabrício Queiroz e dos negócios de Flávio Bolsonaro, o balanço de um mês seria pobre, paupérrimo.

Na campanha, tínhamos um candidato de Twitter, agora temos um governo de Twitter.

O que se nota – e eu, pessoalmente noto ainda mais, com o crescimento do número de provocadores nos comentários – a intensificação da máquina de trolls do bolsonarismo, mas nenhum aumento – ao contrário – nas simpatias que ele despertou.

Mas há um sinal muito mais importante:  desenvoltura com que Hamílton Mourão tem avançado na proposição de medidas que, claramente, corresponderiam a seu chefe legal.

Mourão também tem seus factoides e não se acanha de soltá-los na praça, como este em que sugere a destituição da diretoria da Vale (algo que, aliás, possivelmente aconteceria sem sua “canelada”).

Ainda que seja possível juridicamente, é óbvio que se trataria de uma decisão do presidente, não do vice.

Mas Mourão, que na ativa já mostrou como pouco liga para as cadeias de comando, não se acanha em quebrá-las em seu novo posto, produzindo também as suas “fake news” de suposta afirmação de autoridade.

Depois recua, ameniza, como quem sinaliza que ainda não é a hora do assalto ao poder.

O Bolsonaro do primeiro mês de governo foi um homem perceptivelmente acuado.

Há dúvidas se lançará a proposta de reforma da previdência ainda nos seus dez dias de internação hospitalar ou se deixará Paulo Guedes ser “o pai da criança”.

E depois a depenará como fez Michel Temer, antes de ser atingido pela lama da JBS.

Há um xadrez sendo jogado na distribuição de poder, por jogadores sem habilidade.

Bolsonaro jogava com as pedras brancas, tinha o direito à iniciativa.

Quem ousa, porém, é seu vice.