Os bastidores da ditadura nos 60 anos do golpe: “Melhorou quando começamos a matar”

Atualizado em 28 de março de 2024 às 8:06
Tanque do Exército durante desfile de 7 de setembro em 1972. Foto: reprodução

A poucas semanas de assumir a presidência, Ernesto Geisel recebeu Dale Coutinho, futuro ministro do Exército, para uma conversa no Rio de Janeiro. Os dois generais começaram com conversas triviais, mas logo mergulharam no tema crucial: a repressão à esquerda armada, atingindo seu ponto máximo durante o governo Emílio Médici.

Em um diálogo gravado em 16 de fevereiro de 1974 entre os dois militares, Coutinho destacou: “O negócio melhorou muito. Agora, melhorou, aqui entre nós, foi quando nós começamos a matar. Começamos a matar”.

Geisel emendou: “Porque antigamente você prendia o sujeito e ia lá para fora”. E prosseguiu: “Ô Coutinho, esse troço de matar é uma barbaridade, mas acho que tem que ser”.

A conversa, revelada pelo jornalista Elio Gaspari no livro “A ditadura derrotada” (2003), agora ganha vida na série original do Globoplay produzida pela CBN, intitulada “A ditadura recontada: As vozes do golpe”.

Baseado nos cinco volumes em que Gaspari detalha o regime militar, o podcast oferece acesso a mais de 300 horas de gravações inéditas. Nas fitas, Geisel compartilha segredos da caserna, admite a tortura nos porões e opina sobre os outros presidentes da ditadura.

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Ernesto Geisel. Foto: reprodução

O primeiro episódio da série, disponível nas principais plataformas de áudio a partir desta quinta-feira (28), narra a conspiração que culminou no golpe de 1964. A história é contada através das vozes dos protagonistas, como o governador Carlos Lacerda e o deposto presidente João Goulart.

A quartelada revela que os militares não estavam tão organizados quanto aparentavam, uma vez que nem mesmo haviam combinado uma data para o golpe.

“Eles participaram da deposição do Jango em nome do combate à esquerda e da disciplina militar. No dia da queda do Jango, essa disciplina começou a ser violentada”, constata Gaspari.

Além disso, a ação foi precipitada pelo general Olympio Mourão Filho, que, após dar as ordens por telefone, vestiu um roupão de seda vermelho e foi tirar uma soneca. “Creio ter sido o único homem do mundo que desencadeou uma revolução de pijama”, gabou-se.