O Brasil se dividiu desde sempre entre os (poucos) privilegiados e os (muitos) esquecidos.
É uma divisão presente até na pancadaria que a polícia de Alckmin desfere nos estudantes de São Paulo que lutam apenas por uma coisa: que suas escolas não sejam fechadas.
(A posteridade haverá de anotar esse fenômeno: alunos apanharem da polícia por rejeitarem o fechamento de suas escolas.)
Os termos genéricos – alunos, estudantes – estão sendo empregados erradamente.
Porque não são todos os estudantes que estão sendo castigados. São os estudantes mais humildes, mais simples, de recursos mais contados. Aqueles, em suma, que ninguém enxerga.
A família deles não tem dinheiro suficiente para pagar uma escola particular. E é por isso que eles sofrem nas mãos de uma polícia que despreza pobres.
Os alunos das escolas particulares – meus filhos todos estudaram nelas – estão protegidos, preservados.
Este é o país em que o igualitarismo – aquele sistema sagrado que oferece iguais oportunidades a todos, e assim faz reinar a meritocracia – é uma coisa selvagemente combatida pelos donos do dinheiro e do poder.
Os outros meninos – os abastados – estão agora nos shopping centers de São Paulo fazendo compras de Natal.
Em breve, viajarão para resorts brasileiros, ou para o exterior, e assim se recuperarão para um novo ano de estudos em 2016.
Continuarão a ter os melhores professores, as melhores instalações para aprender, as melhores chances para garantir um futuro ensolarado.
Continuarão também a chegar às escolas confortavelmente acomodados em carros dirigidos pelos pais ou avós, ou por motoristas profissionais.
Bem diferente é a realidade dos meninos que enfrentam a polícia de Alckmin nestes dias.
As escolas estão em ruínas, frequentemente. Professores miseravelmente pagos não têm condições de ensinar como na rede privada. Para chegar a bancos escolares em pedaços, estes alunos se locomovem em ônibus abarrotados, ou simplesmente são obrigados a caminhar pelas ruas poluídas de São Paulo.
Estes garotos – e garotas, é claro – têm que remar várias vezes mais que os demais, e quase sempre em vão.
Muitos desistem de estudar, em algum momento. São obrigados a trabalhar para ajudar a família.
A polícia fará sempre parte de sua vida.
Agora a polícia bate neles com cassetetes. Mais tarde, metralhadoras poderão substituir os cassetetes, como aconteceu recentemente no Rio.
Ninguém os ouve, ninguém lhes dá satisfação.
Alckmin quis tirá-los de suas escolas sem sequer explicar os fundamentos de sua pretensa reforma. Em vez de ouvir os jovens, Alckmin preferiu ouvir o arcebisbo, de quem recebeu o conselho tardio de explicar aos estudantes e suas famílias a lógica de seu plano repudiado.
É assim a vida para eles. São os invisíveis da sociedade.
Às vezes reagem, como aconteceu agora.
E é assim, só assim, que a humanidade evolui: quando quem é pisoteado se insurge.
Por isso a rebelião dos estudantes de escolas públicas de São Paulo deve ser aplaudida com entusiasmo.