Peter Turkson tem boas credenciais, como o não envolvimento em qualquer dos escândalos recentes, mas pode ser de centro esquerda demais para seus colegas cardeais presentes ao conclave.
O texto abaixo é uma versão condensada de um artigo de John Alen Jr no blog do portal New Catholic Reporter. No Brasil, o texto foi publicado no site do Instituto Humanitas Unisinos. A tradução é de Silvia Ferabolli.
Em termos simbólicos, a ideia de uma instituição que é tradicionalmente vista como a última das instituições de Primeiro Mundo ser liderada por um homem negro do hemisfério sul tem uma magia inegável.
Entre os 117 cardeais que logo irão se reunir na Capela Sistina para eleger o sucessor de Bento XVI, o nome do Cardeal Peter Turkson, de Gana, é proeminente na lista de possíveis candidatos africanos.
Na verdade, o próprio Turkson não tem se mostrado tímido no que tange a abraçar essa possibilidade. Em entrevista recente ao Telegraph britânico, Turkson especulou abertamente sobre o significado de ele vir a tornar-se papa.
Peter Kodow Appiah Turkson, 64, nasceu em Gana ocidental de uma mãe metodista e um pai católico, um fato biográfico que cita frequentemente para explicar seu interesse no ecumenismo. Ele estudou num seminário em Nova York, e depois no Instituto Bíblico de Roma. Tornou-se arcebispo de Gana em 1992.
Em 2009, Bento XVI apontou Turkson como secretário-geral de um encontro de bispos na África, que teve um mês de duração. No final do evento, o Vaticano anunciou a nomeação de Turkson como Presidente do Conselho de Justiça e Paz.
Turkson é geralmente visto como uma pessoa afável e aberta, com um senso de humor vibrante e franqueza encantadora, não dado a banalidades diplomáticas piegas. Em toda a África, ele é visto como um dos mais dinâmicos líderes da igreja no continente.
Os argumentos a favor de Turkson baseiam-se em vários pontos:
Primeiro, muitos cardeais querem um papa com profunda experiência pastoral em uma diocese; outros estão procurando alguém que conheça o Vaticano e que possa manter o lugar sob controle. Na medida em que o currículo do Turkson estampa ambas as experiências, ele poderia satisfazer ambos os desejos.
Em segundo lugar, alguns cardeais consideram atraente a ideia de mostrar um rosto não-ocidental para o crescente campo católico fora do Ocidente, e Turkson certamente faria isso num piscar de olhos.
Em terceiro lugar, Turkson assumiria seu posto sem qualquer bagagem oriunda dos recentes escândalos que afligem o Vaticano. Seu nome não está ligado à bagunça dos Vatileaks e ele não teve nada a ver com o banco do Vaticano. Além disso, não há qualquer registro de que ele estivesse envolvido em quaisquer dos casos relacionados à crise de abuso sexual clerical. (Quando a SNAP, o principal grupo de vítimas, recentemente emitiu uma avaliação dos candidatos papais, Turkson estava entre aqueles que o grupo afirmou não ter informações suficientes para julgar).
Em quarto lugar, para uma igreja empenhada em uma «nova evangelização», Turkson seria um líder enérgico, atraente e até mesmo capaz de seduzir as pessoas em direção a um novo olhar sobre a Igreja católica.
Quinto, ele reflete uma ética africana muito tradicional em matéria de moralidade sexual e família, o que significa que a eleição de Turkson não ameaçaria os cardeais mais preocupados com o reforço de uma postura pró-vida da Igreja.
Em sexto lugar, as relações com o Islã certamente estão no topo da lista de afazeres do próximo papa, e Turkson tem experiência pessoal nisso, uma vez que seu tio paterno é muçulmano. Em Gana, Turkson viveu no meio de muçulmanos e tem sido um líder nas relações católico-islâmicas em toda a África. Contudo, ele pode ser bastante firme em suas posições, tendo uma linha forte sobre a necessidade de sociedades muçulmanas respeitarem a liberdade religiosa.
Os pontos negativos de Turkson incluem os seguintes:
Em primeiro lugar, o Conselho de Justiça e Paz não é percebido como um dos departamentos importantes do Vaticano, o que faz com que alguns grupos duvidem que sua carreira tenha lhe dado a preparação necessária para o salto quântico rumo ao papado.
Em segundo lugar, alguns conservadores consideram Turkson um tanto centro-esquerda demais, especialmente em matéria de justiça econômica. Em 2011, seu conselho emitiu um documento intitulado Rumo a Reforma dos Sistemas Financeiros e Monetários Internacionais no Contexto da Autoridade Política Global, o qual expressa uma clara rejeição das políticas econômicas “neoliberais” além de fazer um claro endosso a uma “verdadeira autoridade política mundial” que regule a economia globalizada.
Em terceiro lugar, alguns se perguntam se Turkson está realmente pronto para o horário nobre. Durante o sínodo do outono passado sobre a Nova Evangelização, Turkson fez uso do tempo de uma das reuniões para mostrar um vídeo alarmista do Youtube sobre o Islã, que continha estatísticas sensacionalistas sobre a imigração muçulmana na Europa que já haviam sido completamente desacreditadas.
A reação negativa dentro do sínodo foi tamanha que outros bispos se sentiram compelidos a se levantar e a pedir que ele parasse com as criticas. Embora Turkson tenha rapidamente se desculpado, ele deixou dúvidas em alguns dos presentes sobre sua capacidade de discernimento.
Em quarto lugar, o comentário aberto de Turkson sobre a conveniência de um papa africano, chegando até mesmo a flertar com a ideia de ser ele mesmo, gerou desconforto entre aqueles que acreditam que ele esta fazendo campanha para assumir o posto.
Amigos insistem que essas atitudes simplesmente refletem o caráter honesto e de “cara legal” de Turkson, que não quer dizer “não” aos jornalistas que necessitam de comentários e também não quer ser evasivo em suas respostas.
No entanto, em um processo eleitoral onde colocar-se no centro das atenções é frequentemente desaprovado, ser um cara legal pode ter seu preço.