Pesquisa da USP expõe racismo estrutural nas instituições de saúde

Atualizado em 15 de junho de 2021 às 20:22

Publicado originalmente no Jornal da USP

Por Pedro Ferro

Fotomontagem sobre imagens Clay Banks/Unsplash e Freepik – Arte: Rebeca Alencar/Jornal da USP

O racismo está bastante enraizado na cultura brasileira, tanto que as medidas para combater a discriminação racial, adotadas pelo governo federal, utilizaram pela primeira vez, em 2005, a expressão “racismo institucional” para explicar que ele se manifesta nas estruturas de organização da sociedade e nas instituições, o que inclui o Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), feita em 2015, 23,3% das pessoas negras e pardas já se sentiram discriminadas em serviços de saúde.

A pesquisa de mestrado Análise do racismo institucional na assistência em saúde sexual e reprodutiva no município de Ribeirão Preto-SP, do enfermeiro Marcelo Vinicius Domingos Rodrigues dos Santos, da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, revela que esse problema é tão “comum” a ponto de poucas pessoas identificarem que sofreram discriminação racial.

O intuito do estudo era identificar com que frequência pacientes negros e pardos sofriam discriminação e violência racial em instituições de saúde na cidade de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, e quais tipos de violência os entrevistados identificaram. “Uma das entrevistadas descreveu uma situação que presenciou: no relato, a pessoa diz ter visto uma gestante negra ser ignorada por uma funcionária por algumas horas na sala de espera e, quando a gestante foi atendida, foi tratada como uma paciente comum”, comenta o pesquisador.

Santos também conta que, além da cor de pele, instituições de saúde levam em consideração a classe socioeconômica do indivíduo para definir, por exemplo, a ordem de atendimento dos pacientes. “Os entrevistados relataram comportamentos discriminatórios, por parte dos funcionários de saúde, em decorrência do status social e da cor de pele, algo totalmente contrário ao que está determinado na Política Nacional de Humanização do SUS”, diz.

Entretanto, segundo a pesquisa, poucas pessoas percebem quando sofrem discriminação durante o atendimento. Usando o questionário Escalas de Percepção de Discriminação Racial em Saúde, Santos identificou que, das 182 pessoas entrevistadas, 71,54% delas perceberam, em algumas situações, terem sofrido discriminação racial em serviços de saúde. Já dentre os outros, cerca de 28% dos entrevistados, 81,82% constataram ter visto ou sofrido discriminação racial por parte de médicos e enfermeiros.

Combater o racismo

“Sendo a discriminação racial um problema cultural tão antigo, é difícil combatê-lo”, afirma Santos. “Mas isso não significa que não devamos tentar mudar o cenário atual”, diz. O pesquisador afirma ser necessário conscientizar as pessoas para que não tenham medo de acessar canais de denúncia do SUS quando presenciarem atos discriminatórios por parte dos funcionários.

“Também devemos lutar por um sistema de saúde igualitário, promovendo a reeducação de profissionais da saúde quanto ao atendimento ao paciente e educar melhor os futuros profissionais enquanto ainda estão na faculdade”, afirma o pesquisador. “Além disso, mesmo que tenhamos um longo trabalho pela frente, é necessário educar a sociedade com o intuito de reduzir ações discriminatórias vistas diariamente.”

O mestrado Análise do racismo institucional na assistência em saúde sexual e reprodutiva no município de Ribeirão Preto-SP foi apresentado no final de 2020