Publicado originalmente na Ponte Jornalismo
Por Jeniffer Mendonça
Em vídeo, policial arrasta rapaz e o chama de “verme”; irmã afirma que motoboy foi fazer entrega de pizza e parou para fumar em rua próxima na zona norte de SP
[Esta reportagem está em andamento e vai ser atualizada durante o dia]
“Você é hipócrita, eu só estava fumando um baseado aqui”, grita um jovem negro rendido enquanto um policial militar branco à paisana o arrasta até a parede e o chama de “verme”, “arrombado” e “noia” na região do Tremembé, na zona norte da capital paulista, na noite desta sexta-feira (28/8).
O rapaz é o motoboy André Andrade Mezzette, 29, que aparece nas imagens ao lado da mochila que usou, segundo a família, para fazer uma entrega de pizza na Rua Capinzal. “Ele tinha feito a entrega e parou numa outra rua para fumar um cigarro de maconha e nisso o policial passou de moto, perguntando ‘o que você tá fazendo aqui?’ e ele disse que estava trabalhando e o policial partiu para cima dele”, conta a irmã de André, a estudante Vitoria Andrade Mezzette, 21. “O policial deu uma coronhada na cabeça dele, ele tomou dois pontos”, denuncia.
Segundo o boletim de ocorrência, o policial à paisana é o soldado Felipe da Silva Joaquim, e mora no bairro. Ele alegou que estava retornando para sua casa quando “percebeu um indivíduo estranho parado em frente a uma motocicleta” e que ele “teria feito menção de sacar uma arma”. Nesse momento, o PM afirma que parou sua moto e sacou uma arma se identificando como policial e que André teria corrido a pé e, ao alcançá-lo, teriam “entrado em luta corporal” e que por isso o motoboy teria se machucado.
Ao ser rendido, o PM disse que André teria o ameaçado, dizendo que “era da quebrada” e que “iria voltar”. Outros dois policiais militares foram acionados e levaram o motoboy à UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do Jaçanã, onde ficou internado para a realização de uma tomografia.
No documento, não há a versão do rapaz. O delegado André Cesar Pereira Leocata, do 73 DP (Jaçanã), indiciou André por roubo tentado, “tendo em vista o agente ter usado de grave ameaça (simular estar armado) para subtrair coisa alheia móvel, só não alcançando seu intento por circunstâncias alheias à sua vontade”, escreveu.
No momento em que atendeu a reportagem, Vitória estava na Corregedoria da PM. “Vou mostrar os vídeos e dar meu depoimento porque ele não estava assaltando”, disse à Ponte. Os vídeos são de vizinhos que gravaram a abordagem do policial. “Eu tentei ir atrás das testemunhas, mas o pessoal tem medo porque o PM mora ali no bairro”, apontou.
Vitória afirma que os familiares e amigos farão um ato em frente ao 72 DP (Vila Penteado), onde André estaria preso, para pressionar para que não seja transferido a um CDP (Centro de Detenção Provisória).
Convidado a analisar as imagens pela Ponte, o advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos e segurança pública pela PUC- SP e conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos), diz que “pelas imagens o pm pode ser investigado por abuso de autoridade, ameaça, calúnia, injúria e difamação e até tortura por manter o rapaz sob uma arma apontada pra cabeça e ter praticado agressões”.
Castro também aponta irregularidades no procedimento da polícia civil: “a polícia civil deveria ter ouvido o rapaz, um investigador deveria ter ido a unidade de saúde”.
Outro lado
Procurado pela Ponte, o soldado Felipe da Silva Joaquim disse que “minha versão é do B.O. (boletim de ocorrência) na polícia civil. No vídeo que estão me acusando não houve nada. Apenas esperei chegar o apoio e deram prosseguimento dos fatos”. Sobre os xingamentos, Felipe afirou que “isso é vocês que estão falando”.
A reportagem procurou a assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública, que informou em nota que “um homem, de 29 anos, foi preso em flagrante após tentativa de assalto a um policial militar de folga na noite da última sexta-feira (28), no Tremembé, zona norte da capital. O caso foi registrado como tentativa de roubo de veículo no 73°DP. A Corregedoria da PM acompanhará o caso”.