Por Moisés Mendes
Temos mais uma prova de que as agitações de bolsonaristas, a partir do final de 2020, em reação a decretos de lockdown de Estados e municípios, eram insufladas de dentro do Planalto com o objetivo de criar conflitos e o caos.
É o que revela o livro ‘Sem Máscara’, do jornalista Guilherme Amado, que a Companhia das Letras está lançando. Bolsonaro enviava seus mandaletes para as ruas, para que as medidas de contenção da pandemia fossem desafiadas, pensando que assim criaria o clima propício à intervenção do Exército.
Uma dessas balbúrdias de fascistas aconteceu no fim de 2020 em Pelotas, quando uma grande aglomeração, no centro da cidade, desafiou o bom senso, a saúde pública e a autoridade da prefeita Paula Mascarenhas.
A agitação motivou autuações de empresários que incitavam uma rebelião contra o lockdown baixado pela prefeita. Um conhecido sonegador participou da confusão da extrema direita.
Bolsonaro não conseguiu levar o plano adiante porque o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, negou-se a colocar soldados nas ruas. A desobediência provocou a demissão do general, em março de 2021, como conta Amado no livro.
O jornalista relata que a confissão da causa da demissão foi feita pelo próprio Bolsonaro ao ministro Dias Toffoli, numa conversa na biblioteca do Palácio do Alvorada, em maio de 2021.
Bolsonaro pretendia chamar a medida, que poderia determinar restrições ao ir e vir e outras intervenções, de “estado de emergência do bem”.
Este é o trecho do livro em que Bolsonaro confessa seu plano:
“Bolsonaro julgava natural demitir Azevedo e Silva em decorrência de sua recusa em ordenar que o Exército fosse às ruas. Um mês e meio depois da saída do general, o presidente relembraria o episódio em uma conversa com Dias Toffoli, que fora ao Alvorada a convite do presidente. Foi recebido na biblioteca. Era a primeira oportunidade que Toffoli tinha desde aquele 29 de março, para, a sós com Bolsonaro, perguntar ao presidente por que demitira o ministro. Alguns momentos da conversa foram interrompidos por um garçom e um ajudante de ordens. O general não contara a Toffoli o motivo da demissão, fiel a uma postura discreta que, ao sair da assessoria do ministro do Supremo para o Ministério da Defesa, avisou que teria em relação aos temas de governo.
“Por que o senhor demitiu o general Fernando?”, perguntou Toffoli.
“Queria fazer um estado de emergência do bem e ele não quis.”
“Como assim, presidente? O que seria isso?”, perguntou um espantado Toffoli.
“Queria colocar o Exército nas ruas para abrir as lojas e abrir os estados e municípios porque os governadores e prefeitos fecharam tudo. Então eu queria abrir, tentar manter o emprego e a economia funcionando”, detalhou Bolsonaro, como se descrevesse algo trivial.
O presidente explicou a Toffoli que o Brasil não aguentaria mais um ano com “tudo fechado”. Disse saber que, “com a pandemia e a economia fechando”, seu governo seria impactado. Teria um preço a pagar pela economia estagnada, sem crescimento.
“Presidente, isso não tem cabimento. Para de exagerar, para com essa coisa”, aconselhou Toffoli, reeditando a postura que em diferentes ocasiões havia adotado na presidência do STF. Bolsonaro ouviu, não contra-argumentou, e a conversa naturalmente mudou para outro assunto.”
Agora, ainda falta saber por que Azevedo e Silva deixou o cargo de diretor-geral do Tribunal Superior Eleitoral em fevereiro deste ano.
Azevedo e Silva disse que saía por motivos pessoais, alegando que devia se dedicar a um tratamento de saúde.
Mesmo que essa explicação deva ser respeitada, não há como não considerar, nessas circunstâncias, que os motivos também possam ter sido outros, ou que, sob pressão dos próprios colegas golpistas e com a saúde fragilizada, o general tenha decidido abandonar o TSE.
Azevedo e Silva havia sido convidado para o cargo pelos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, para funcionar como uma controversa espécie de trincheira em defesa do TSE, da eleição e da democracia. Ele já havia sido assessor de Toffoli no Supremo.
É possível, pelo que se sabe até aqui, que Azevedo e Silva tenha sido derrotado duas vezes, como ministro e como diretor do TSE.
(Texto originalmente publicado em BLOG DO MOISÉS MENDES)
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