A seleção senegalesa tem sido tema de notícias e discussões nesta Copa do Mundo. Mas em vez de tática, vigor físico, gols de placa ou caneladas, o que chamou a atenção no escrete africano foi a presença do técnico Aliou Cissé, o único negro entre os 32 participantes no torneio.
O predomínio de treinadores brancos à frente dos times de futebol, inclusive de seleções da África negra, é um fato concreto. Dos 20 clubes que disputam a primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol deste ano, apenas Roger Machado, do Palmeiras, e Jair Ventura, no comando do Santos, são negros.
Isso leva ao seguinte questionamento: por que há poucos técnicos negros em um esporte em que eles têm presença expressiva entre os atletas?
As razões não são muito explícitas. Uma matéria do The Guardian abordou o assunto em 2014, e se não chegou a uma conclusão, pelo menos jogou alguma luz em busca de respostas para a pergunta.
De acordo com o Guardian, naquele ano havia somente quatro técnicos negros ou representantes de minorias étnicas entre os 92 clubes da Premier League e da Football League, que englobam as quatro primeiras divisões do futebol inglês. O número significa menos de 5% do total. Por outro lado, entre os jogadores a presença de negros fica na casa dos 25%.
A matéria cita um estudo do pesquisador Steven Bradbury, que se debruçou sobre o tema. Uma das hipóteses que ele levanta é que o filtro racial começa ainda dentro dos campos, pelo menos nos casos dos técnicos que foram ex-jogadores. Dentre os treinadores que começaram a carreira como atletas, um bom número deles ostentou a braçadeira de capitão, posto de liderança e interlocução com a comissão técnica.
E este status, segundo Bradbury, é dado com mais frequência aos jogadores brancos, reproduzindo o estereótipo de que estes seriam mais cerebrais, em oposição aos negros, cujo destaque seria o vigor físico.
Por aqui, um dos exemplos mais emblemáticos deste fenômeno é Andrade, único técnico negro a conquistar o campeonato brasileiro de futebol, em 2009, pelo Flamengo. Mesmo com o título e o histórico no clube – volante clássico, com passes elegantes e precisos, é um dos heróis do clube rubro-negro – foi demitido no ano seguinte à conquista do título, apesar do índice de 76% de aproveitamento.
Seguiu treinando times de menor expressão, como Brasiliense e Paysandu, até decidir dar um tempo na profissão de técnico. Junto com Cristóvão Borges, ex-jogador e técnico com passagens por Fluminense e Vasco, e Lula Pereira, que treinou o Flamengo, engrossa a galeria de técnicos negros atualmente sem emprego.
Pode ser que futuramente eles voltem a atuar, e somados à entrada de novos nomes no mercado, como Roger Machado e Jair Ventura, contribuam para que as estatísticas raciais referentes aos treinadores se aproximem da realidade de dentro dos gramados.
Mas considerando que o futebol é gerenciado por homens brancos e que o posto de técnico, embora instável, seja um espaço privilegiado de poder, não dá para ter esperança de mudanças radicais neste cenário.
Caso existam, os avanços virão de forma lenta, gradual e segura, bem ao gosto dos atuais donos do poder.