De Paris
Leio numa banca da cidade que a cantora francesa Françoise Hardy está ameaçando deixar a França caso o candidato socialista François Holland derrote Sarkozy nas eleições presidenciais de maio. É uma possibilidade que parece cada vez maior com o correr dos dias.
A razão da ameaça é que Holland está anunciando uma taxação de 75% para as pessoas cujos rendimentos ultrapassem 1 milhão de euros por ano. Hardy está distante disso. Tira, segundo ela, cerca de 150 mil euros anualmente.
Mesmo assim, está paranóica.
Vamos colocar da seguinte forma. Pessoas ricas que ameaçam deixar um país por causa do imposto fazem mal ao país. É bom mesmo que saiam. Mas o fato é que quase sempre elas estão blefando. Sociedades desenvolvidas, como as da Escandinávia, são marcadas por um consenso em que os que podem mais pagam mais para que todos vivam da melhor maneira possível.
Em países como a Inglaterra e os Estados Unidos, o que aconteceu nas últimas três décadas foi o inverso. Os milionários foram encontrando fórmulas – legais – de pagar cada vez menos, e daí brotaram abismos de desigualdade. Dias atrás, o ministro da Economia do Reino Unido, George Osborne, conservador, se disse perplexo ao descobrir que os superricos britânicos estavam pagando apenas cerca de 10% de imposto de renda.
Nos Estados Unidos, bilionários como William Buffett pagam proporcionalmente menos imposto de renda que suas secretárias. O próprio Barack Obama – Barack Obush, se preferirem – contribuiu em 2011 com apenas 20% de seus rendimentos de cerca de 1 milhão de reais, vindos parte da presidência, parte dos livros que escreveu.
Uma pataquada, como diria minha filha Camila. Pataquada master.
Eis uma coisa que a Receita Federal brasileira deveria fazer: divulgar a composição do dinheiro que os brasileiros – pessoas físicas e jurídicas – pagam em imposto de renda. Isso no mínimo traria racionalidade ao debate em torno do famoso “Custo Brasil” – os supostamentos pesados encargos que recaem sobre as empresas.
Desconfio, mais que isso, aposto o que tenho no bolso que temos no Brasil uma situação fiscal parecida com a dos Estados Unidos e a da Inglaterra. A elite – salvo em lugares em que o interesse público verdadeiramente impera, como, repito, na Escandinávia – encontrou nas últimas décadas manobras para pagar cada vez menos imposto. Os paraísos fiscais são apenas uma delas. Governos lenientes fecharam os olhos para isso, e o preço é uma crise social fortíssima que dividiu a sociedade entre o 1% feliz e os demais 99% indignados.
Pagar imposto é o preço inescapável que se paga por uma sociedade harmoniosa, em que você possa ir para a rua sem medo de ser assaltado.
Mas o 1% acha que isso – imposto — é coisa para os 99%.