O segundo mandato veio menos das virtudes de Obama do que dos defeitos de Romney
Obama foi um enorme decepção. Ainda assim , foi bom para os Estados Unidos e para o mundo que ele tenha derrotado Mitt Romney.
Romney é um arquiconservador que simboliza a iniquidade social que se alastrou globalmente nas últimas três décadas – e é o maior drama moderno, aquele que ocupa a prioridade entre as prioridades de homens públicos sérios em toda parte.
A imagem que ficará de Romney para a posteridade é a do magnata que, sem perceber que gravavam suas palavras, disse a um dono de cassino que não ligava para os 47% dos americanos mais desassistidos e mais pobres. Para ele, são os “loosers”, os derrotados da sociedade americana.
Obama teve a sorte de enfrentar um candidato que representa o zeitgeist, o espírito do tempo, às avessas. Romney é um daqueles casos de ricos que encontraram múltiplas maneiras de sonegar – dentro da legalidade amoral – impostos.
As únicas duas declarações de renda que ele publicou, depois de intensa pressão, mostravam que ele pagou de imposto alguma coisa na faixa de 13% — uma ninharia, uma migalha, um absurdo para quem tem uma fortuna como a dele.
Romney acusou a China de competição desleal, mas não hesitou, em sua vida de empreendedor, iniciada aliás graças a uma milionária herança paterna, em usar mão de obra chinesa em empresas que ele comprou semiquebradas para — fazendo cortes brutalmente e assim dando aparência de saúde a negócios na realidade doentes — vender logo depois com altos lucros. Romney é o Gekko, do filme Wall Street, na vida real.
Obama, espertamente, explorou isso em sua campanha. Obama incorporou, sem citar, as linhas essenciais dos protestos do movimento Ocupe Wall Street. Ele caracterizou Romney como o “1%” e disse querer governar os Estados Unidos por mais quatro anos em nome dos menos afortunados – os “99%” do OWS.
Espera-se que, em seu segundo mandato, Obama faça mais do que fez no primeiro pelos “99%”. Se der foco a atenção a eles, talvez se ocupe menos em matar inocentes no Oriente Médio com os infames drones, os aviões de guerra não tripulados.
O conceito de “justiça social” deu a vitória a Obama, assim como derrotou, há seis meses, o presidente francês Nicolas Sarkozy.
Com enorme atraso, num artigo no Estadão, FHC notou que para o PSDB não virar insignificante o partido tem que se conectar com os pobres, ou, sigamos na linha do OWS, os 99%.
Mas isso não se materializará enquanto as lideranças tucanas forem políticos como Serra, Alckmin e Aécio. São homens que representam exatamente o oposto, o 1%, e que por isso são tão favorecidos por colunistas como Dora Kramer, Merval Pereira e Arnaldo Jabor, entre tantas outras almas gêmeas – articulistas arquiconservadores que dão apoio a ideias como as de Mitt Romney mas não dão votos.