Às vezes acho que as revistas femininas vivem numa dimensão paralela. Outro dia, por exemplo. Eu estava navegando ao acaso, como um veleiro perdido na imensidão azul, quando vi na tela de meu laptop meia-boca um artigo da Cosmopolitan, a Cosmo, americana, a mãe de todas as revistas para a mulher supostamente moderna.
Era em cima da história do Tiger Woods, o sexualmente voraz jogador de golfe, como se viu, apesar da cara de santo, da expressão de quase bobo. Parecia um MP, Marido Perfeito. “É curioso”, gostava de dizer Tio Fabio, falecido homem sábio do interior, Deus o tenha. “Elas confiam nos homens com cara de bonzinho quando eles são, exatamente, os mais perigosos. Tudo neles é fajuto e hipócrita, e a expressão de santo mais que tudo.” Segundo Tio Fabio, nem o Belzebu sabe o mal que se esconde no coração dos santinhos, tamanha a dissimulação cínica deles.
A Cosmo pareceu de fato espantada com a revelação de que Tiger Woods traiu sua mulher e não apenas uma só vez. Prevaricou um bocado. A enganada é uma loira bonita, bem tratada e bem vestida, aquele tipo que nosso amigo Cafa definiria grosseiramente, numa palavra, olhos arregalados fixos no decote, como gostosa. Veio daí a perplexidade da revista. Como se houvesse uma regra segundo a qual mulheres com determinadas medidas estariam imunes a ser passadas para trás. O título mostrava essa ingenuidade colossal. Era assim, literalmente: “Por que os homens enganam as gostosas?”
Minha lista curta de respostas possíveis:
1) porque podem ser arrogantes devido à beleza;
2) porque podem ser, simplesmente, ruins de cama;
3) porque talvez não se empenhem o suficiente por achar que traços bonitos resolvem tudo;
4) porque podem ser egoístas e querer fazer apenas as coisas que as agradam, como se o homem fosse um escravo;
5) porque para não engordar comem muito pouco e, por isso, podem ficar com o hálito azedo.
Deu?
Um amigo meu fotógrafo brasileiro que vive na Argentina namorou, certa vez, uma atriz de novela de uma televisão que aparecia sempre na Holá!, a Caras deles. Quando eu soube, perguntei a ele como era esse namoro. “Já dei bota”, ele me avisou. “Uma negação na cama.” Ele me contou que, por um momento, chegara a pensar que o problema estava nele, mas uma noite com outra mulher provou-lhe que não era assim. Ela era a questão.
Há um erro básico que as pessoas frequentemente cometem. Uma mulher sensual, por exemplo. Ela não se define pelas curvas, mas, como diz a palavra, pela volúpia, pela intensidade dos seus sentidos. Pela maneira como ela gosta de tocar, sentir, cheirar o seu homem.
Essas, não digo que não sejam traídas, tão instável e cruel é o universo com suas tentações que chegam aos inocentes na alma como raio em céu azul. Mas é mais difícil. O homem pensa uma, duas, várias vezes antes de dar um passo que possa colocar em risco uma mulher que o trata na cama como ele merece. Na maior parte das vezes, demora tanto pensando que a tentação passa.
Eis a mulher de fato gostosa. Não se define pelos cabelos, não se define pelo decote, não se define pelos contornos, não se define pelo peso.
É uma questão de atitude. Isso a Cosmo deu a impressão de não saber no artigo tolo sobre a traição em série de Tiger Woods.