As centrais sindicais CUT e CTB, as maiores do Brasil, escolas particulares, metroviários, petroleiros, setores da Igreja Católica e até evangélicos vão aderir à greve geral marcada para o dia 28 de abril.
A paralisação promete, segundo os sindicalistas, ser a maior em 30 anos, quando ocorreram as greves do ABC paulista que revelaram Lula e o PT para a política nacional.
Mas não os jornalistas.
Os profissionais de imprensa enfrentam anos de precarizações e demissões em massa na década de 2010, especialmente pelo declínio dos grandes grupos na ascensão da internet e a crise econômica brasileira.
Segundo o site Volt Data Lab, do jornalista Sérgio Spagnuolo, pelo menos 500 foram demitidos em 2016. No ano, portais como iG encerraram sucursais em Brasília e veículos como Fato Online, da mesma cidade, atrasaram salários e demitiram 100 pessoas em seis meses de atividade.
Considerando os anos de 2012, 2013, 2014 e 2015, o número de repórteres e editores desligados dos grandes grupos de mídia chegou a mais de mil, segundo o Volt Data Lab.
Os dados consideram notícias dos portais Comunique-se, Imprensa e Portal dos Jornalistas.
As corporações trocam os funcionários de carteira assinada por “freelancers fixos”, profissionais Pessoa Jurídica e outras flexibilizações que desconsideram direitos trabalhistas.
As medidas tornam o trabalho dos jornalistas cada vez mais mal remunerado, às vezes abaixo do piso salarial entre R$ 2 mil e R$ 3 mil para sete horas de trabalho nas grandes capitais brasileiras.
As campeãs de demissões nos últimos quatro anos foram Editora Abril, com 177 jornalistas, seguida por Portal Terra (110), Infoglobo (dos jornais do Grupo Globo, que cortaram 98 profissionais), Grupo Estado de S.Paulo (98) e Grupo Folha (94).
Os jornalistas teriam, portanto, todos os motivos para ir contra a Reforma da Previdência de Temer, que prolongará a aposentadoria pública por tempo de trabalho, e as mudanças da CLT, que basicamente dão legalidade para a precarização da categoria.
A greve deveria incentivar repórteres a deixarem de atualizar sites, jornais, revistas e a televisão para brigarem por seus direitos.
Mas não é o que acontece.
“Sou um profissional Pessoa Jurídica, que emite nota fiscal e poupa empregadores de impostos, e fui empurrado para ser ‘empreendedor’, como muitos de nós no jornalismo. A gente chegou ao absurdo de termos um sindicato que se tornou um dos piores inimigos da classe. Fechou os olhos para a ‘pejotização’ e para as diversas violências que sofremos. É um sindicato de enfeite, servil ao patronato. Chegamos ao ponto que chegamos não só por jornalistas aceitarem as condições impostas por empregadores. A categoria não teve amparo, nem do sindicato nem do Ministério do Trabalho”, diz Mario Palhares, que é fotógrafo freelancer.
Ele vai trabalhar no dia 28 de abril para um sindicato, mas diz que a categoria não foi protegida por colegas e muito menos pelo Ministério do Trabalho.
“A classe precisa voltar a se ver como classe, pra começar. Motivos para parar nós temos de sobra. Agora, greve de jornalista não é muito efetiva. Um estagiário, um editor ou um computador consegue fazer um jornal inteiro, se bobear. Os veículos de esquerda pararem ou simularem uma paralisação é uma situação risível. Como não cobrir uma greve? É a hora de trabalhar e trabalhar bem. Usar o jornalismo na sua real função. Se os profissionais, e aí não coloco só os jornalistas, dos grandes veículos parassem, seria uma boa”.
“Acho que os veículos de comunicação tem sim que parar também, todos. Acredito que no nosso caso não precisa ser o dia todo, até porque temos muitos leitores interessados na repercussão da greve geral. Terá muita gente na rua e possíveis conflitos”, afirma George Marques, repórter do site Intercept.
Marques não é CLT e nem PJ, uma vez que seu contrato de trabalho é feito diretamente de Nova York. “Acho que o Sindicato dos Jornalistas não toma uma posição mais forte por uma essência da nossa profissão, de produção continua de informações. Mesmo assim acho simbólico é necessário parar nem que seja metade do dia. Se eu não tivesse essa manifestação para cobrir não trabalharia. Só com o povo nas ruas tem força para evitar a retirada de direitos da classe trabalhadora”.
“Alguns sindicatos municipais e estaduais têm feito seu trabalho, tanto no apoio à greve quanto na hora em que a polícia nos prende. A questão é que boa parte destes sindicatos sofrem influência direta ou indireta justamente dos patrões das mídias tradicionais. O pessoal das artes cênicas têm uma experiência interessante nesse tipo de luta, que é a Cooperativa Paulista de Teatro. Jornalista, mesmo os de esquerda, precisam de mais leitura histórica e compreensão da luta de classes. Acho que uma cooperativa pode ser um caminho melhor que o sindicalismo”, afirma Victor Amatucci, que é funcionário CLT da Fundação Perseu Abramo, vinculada ao PT, e mantém o blog de política e crítica de mídia Imprença.
“Há um sentimento na categoria contra as medidas do governo Temer. Como isso vai se materializar em ações no dia 28 nós não sabemos. Vai da conjuntura de cada redação. Sabemos há movimento na Editora Abril de paralisação, EBC vai parar toda e tem o caso dos jornalistas da revista Carta Capital. O que isso vai produzir só veremos no dia”, diz André Freire, secretário geral do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo.
Eu perguntei para Eliane Cantanhêde e Ricardo Noblat se eles iriam trabalhar nesta sexta-feira pelo Twitter.
Nenhuma resposta dos dois.
Noblat, do Globo, fez uma enquete entre seus leitores sobre o assunto. Eles se declararam favoráveis (51% de 5400 votantes). Noblat finge-se de morto.
A explicação para o fura-grevismo, afinal, pode estar numa frase de Mino Carta: no Brasil, jornalista é pior do que patrão.