Publicado originalmente no site do Brasil de Fato
POR IAGO MONTALVÃO, estudante de Economia da USP e presidente da União Nacional dos Estudantes
O ministério da Educação (MEC) sempre foi um setor estratégico para os projetos políticos gerais dos governos que assumiram o poder executivo no Brasil. Por vezes, um projeto de fortalecimento do desenvolvimento nacional com a educação no centro da formação emancipatória do povo brasileiro e da inovação científica, como vimos com Darcy Ribeiro, que teve seu percurso impedido pelo golpe militar.
Em outras vezes, o projeto colocado foi o de expansão de uma concepção mercadológica e privatista de educação, como o de Paulo Renato no governo FHC, que fez com que a balança de matrículas no ensino superior chegasse pendesse para as instituições privadas, que chegou a ter quase 90% dos estudantes. Balança esta que só pôde ter uma leve recuperação após o ciclo de expansão e democratização das universidades e institutos federais durante os anos de 2007 a 2012.
Também em uma virada radical de hegemonia no campo político, como temos visto com o governo Bolsonaro, o MEC se torna uma peça fundamental para assentar sua posição na disputa ideológica da sociedade, buscando inverter valores, revisar concepções políticas e visões historiográficas que já estavam bastante consolidadas.
Na sustentação do governo, a disputa ideológica, de valores e tradições são eixos estratégicos. Portanto, o campo da educação tem servido até agora apenas para servir de sustentáculo ideológico do reacionarismo e do obscurantismo característicos desse grupo político.
Weintraub é justamente, para além de uma figura polêmica e contraditória, a personificação desse programa conservador e reacionário em que o governo tenta se assentar para manter sua bolha de aprovação. Isso se evidência na procura incessante do ministro em apresentar declarações polêmicas, ofensivas e acusatórias contra as universidades, os professores e os estudantes, mas sem nunca avançar em ações práticas ou planejamentos estratégicos para sanar os desafios reais que a educação brasileira ainda enfrenta.
Em contraposição às frequentes provocações às universidades públicas, não há nenhum avanço que se note rumo às metas e estratégias do PNE, quase nenhum esforço em priorizar o debate do novo Fundeb e um péssimo diálogo com reitores e administrações de universidades, com profunda ineficiência na gestão do repasse das verbas das instituições federais de ensino superior, o que provocou um ano perdido de crise permanente na educação brasileira.
Esse ministro é também homem forte de Bolsonaro, saiu da cozinha do presidente, onde também figuram outros Weintraub, e que, apesar de estar cumprindo um papel de testa de ferro do reacionarismo ideológico, também tem em suas origens políticas fortes relações com os grupos da política econômica ultra-neoliberal que absorveram Bolsonaro.
Aqui se localiza uma das grandes contradições, e um símbolo de sua incoerência, pelo fato de que mesmo após fazer uma tabelinha com Guedes ao sustentar os cortes na educação e apresentar um projeto de cunho profundamente neoliberal e privatizante como o Future-se, Abraham agora tenta se colocar em uma posição de enfrentamento aos grupos oligopolistas da educação privada, como deixou muito claro em sua presença na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, por se sentir ameaçado por esses setores.
Ora, mas é justamente um ministro que usa de seu posto e da sua referência enquanto pessoa pública para ferir a moral e a imagem das universidades públicas, construídas com muito suor por muitas décadas, que contribui para o enfraquecimento da força social dessas instituições no Brasil e no mundo.
É justamente um ministro que bloqueia verbas, e faz disso uma piada, embaralhando todo planejamento de gestão financeira das administrações e prejudicando a garantia do financiamento público, é que contribui para o aumento da evasão estudantil e o sucateamento das instituições federais de ensino superior.
É justamente esse entrelaçamento de um projeto de aparelhamento ideológico e de política neoliberal do MEC que contribui para o fortalecimento dos oligopólios do ensino privado, para o desmonte da autossuficiência da pesquisa brasileira nas instituições públicas e a entrega total do nosso potencial científico para ou para o obscurantismo ou para as empresas, sobretudo as estrangeiras.
É nesse sentido que, mesmo atentos aos anseios agressivos do mercado oligopolista do ensino privado, não devemos temer em exigir com veemência a demissão de Weintraub do cargo de ministro da Educação. Primeiro porque falas, entrevistas e declarações, sejam elas dadas a jornalistas, feitas por vídeo ou em redes sociais, por parte de uma autoridade de primeiro escalão do governo não devem jamais ser relativizadas, pois têm um impacto simbólico relevante na sociedade e que se desdobram em consequências reais e estruturais.
Mas também porque essa postura que unifica um projeto de instrumentalização ideológica conservadora do MEC e ao mesmo tempo de caráter privatista e mercadológico só tem a prejudicar nossa educação. E nenhum ministro que venha para destruir a educação deve ter paz dos estudantes ou de qualquer um que se preocupe com o futuro do nosso país.