“Precisamos de lutadores”: a estratégia de Tsipras de dar voz aos gregos

Atualizado em 10 de fevereiro de 2015 às 14:28
Alexis Tsipras
Alexis Tsipras

Publicado na DW.

 

Vaso Vouvani, uma mãe de meia-idade, há muito tempo desejava um líder que defendesse os interesses dos gregos – “e não dos banqueiros, dos eurocratas ou dos políticos alemães”, como diz.

“Precisamos de lutadores, não de servidores da troica”, argumenta, se referindo aos credores internacionais, que emprestaram bilhões à Grécia, em troca de medidas de austeridade que enfraqueceram a economia do país. “Perdemos nosso dinheiro e nossa dignidade nestes últimos cinco anos. Não podemos deixar que os líderes em Bruxelas e Berlim continuem nos punindo com austeridade. Não está funcionando.”

Durante a crise, Vouvani perdeu seu negócio e não trabalha há quatro anos. Agora, ela está aliviada e animada em ver o primeiro-ministro Alexis Tsipras, de 40 anos, enfrentar tanto o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, como os oligarcas gregos sonegadores de impostos.

“Espero que ele lute contra todos eles”, diz. “Eu vou ficar muito desapontada se ele recuar. Eu não quero ver outro político grego abaixar a cabeça para as pessoas que nos tratam como se fossemos nada.”

Em seu primeiro discurso no Parlamento, Tsipras disse exatamente o que ela queria ouvir: prometeu acabar com as medidas de austeridade, ajudar os pobres, reformar um sistema político corrupto, caçar os grandes sonegadores e até mesmo vender os carros de luxo financiados pelos contribuintes e usados por membros do gabinete e deputados.

“Nosso governo quer ser a voz do povo, para expressar a vontade do povo”, declarou, em um discurso emotivo, aplaudido de pé.

“Programa ponte”

Nick Malkoutzis, editor do site de análise econômica e política Macropolis, sediado em Atenas, disse à DW que a insistência de Tsipras em “manter suas promessas pré-eleitorais estão ecoando muito bem em casa”.

“Isso é impulsionado por sua crença de que, ao contrário dos governos anteriores, a administração liderada pelo Syriza deve cumprir o maior número possível de promessas de campanha”, avalia Malkoutzis. “E, ao contrário dos líderes anteriores, pela crença de que ele não deve ceder ao primeiro sinal de pressão dos credores da Grécia.”

Essa pressão já está presente. O Banco Central Europeu, por exemplo, cortou o crédito para os bancos gregos. E os líderes da Alemanha, que forneceu a maior parte dos empréstimos de resgate para a Grécia, se recusaram a apoiar um alívio da dívida ou qualquer renegociação do acordo.

Tsipras disse que ele vai buscar a cooperação da zona do euro em um “programa ponte” – não incluindo empréstimos, mas algum outro tipo de financiamento –, para manter a Grécia solvente durante o verão europeu, na esperança de alcançar um novo acordo. E, embora ele tenha delineado uma agenda política ambiciosa em seu discurso no Parlamento no domingo, foi vago sobre detalhes ou sobre o calendário de implementação.

“É importante notar que a imprecisão do cronograma de implementação, combinada com a falta de detalhes, deve dar ao governo certa margem de flexibilidade nas negociações com os credores oficiais”, escreveu Wolfango Piccoli, diretor executivo da empresa de consultoria financeira Teneo Intelligence, sediada em Londres.

Estratégia de alto risco

A posição intransigente de Tsipras leva a Grécia a um território desconhecido. Alguns se perguntavam se o discurso do premiê seria um sinal de que o país sairia do euro – algo que as pesquisas mostram que a maioria dos gregos não quer.

“Não dá para ver como a Grécia agora permanecerá no euro, a menos que o eleitorado force uma mudança de [governo] depois dos controles de capital impostos”, tuitou na noite de domingo Hugo Dixon, colunista da agência de notícias Reuters e que acompanha de perto a situação grega.

Malkoutzis, no entanto, acha que os temores de saída da zona do euro são prematuros. “É evidente que a estratégia Tsipras é de alto risco e, porque não estivemos por aqui antes, não sabemos como a zona do euro vai reagir”, sublinhou. “Mas, ao mesmo tempo, ele não está fechando a porta para negociações. Há um pequeno período de tempo em que essas conversas podem ocorrer, e é claro que elas vão ser tensas e desconfortáveis.”

Segundo ele, nas administrações anteriores, a equipe grega entrou em negociações com a zona do euro na crença de que não havia alternativa a não ser aceitar os termos dos credores. Neste caso, Tsipras está tentando inverter a abordagem.

Engrossar a voz

Pesquisas de opinião mostram que a estratégia está funcionando muito bem em casa. Cerca de 70% dos gregos dizem que estão felizes que alguém finalmente esteja engrossando a voz ao lidar com a zona do euro.

Vouvani, por exemplo, está contente com o fato de Tsipras tentar forçar a Alemanha a pagar um empréstimo da época da Segunda Guerra Mundial. O Syriza alega que os alemães devem cerca de 160 bilhões à Grécia em reparações pelos danos causados pelos nazistas.

“Não tenho problema algum com o povo da Alemanha”, garante. “Mas seus líderes não podem continuar nos dizendo que devemos dinheiro a seus contribuintes, que estamos, de alguma forma, privando-os de dinheiro, quando eles também nos devem.”

Malkoutzis acredita que Tsipras deu uma voz aos gregos, mas que a zona euro prefere ver o premiê “moderar suas expectativas, seus objetivos, para ser mais conciliatório sobre pontos que lhes dizem respeito, como as privatizações ou regulamentações trabalhistas”.

“A questão é se os dois lados conseguem, a portas fechadas, encontrar um terreno comum e resolver o suficiente de suas diferenças para manter a zona do euro funcionando como vem sendo desde 2010”, frisa. “Isso é o que vamos ver.”