Preto no táxi é ladrão? Por Jean Willys

Atualizado em 23 de fevereiro de 2018 às 16:33

Publicado no Facebook do autor.

Vejam que situação absurda a qual foi submetida a atleta Rafaela Silva, medalhista olímpica, mulher preta nascida e criada na Cidade de Deus. Ela foi vítima de uma abordagem policial racista enquanto voltava para casa após desembarcar no aeroporto e pegar um táxi. Desde já presto minha total solidariedade à Rafaela, que já declarou que acionará os meios legais na busca por justiça. Assim que terminei de assistir ao vídeo, lembrei de um episódio que aconteceu no ano de 2015, durante uma reunião da CPI (comissão parlamentar de inquérito) que apurou as causas, razões, consequências, custos sociais e econômicos da violência, morte e desaparecimento dos jovens negros e pobres no Brasil.

Uma das “causas e razões” que a comissão apurou foi o RACISMO e o CLASSISMO impregnados no imaginário dos agentes das forças de segurança (preconceitos que fazem parte do discurso que sustenta a ideologia que está por trás das políticas de “segurança pública” que vigoram no Brasil), e eu usei o microfone para apontar que as polícias, no Brasil, são formadas num imaginário racista que as leva a acreditar que “uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa”. Um deputado federal, que virou réu no STF por me difamar, publicou um vídeo editado com a minha fala, apagando a primeira parte e transformando um discurso indireto em direto, como se eu mesmo tivesse afirmado que “uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa”. Muitos de vocês já devem ter visto esse vídeo manipulado circulando diversas vezes nos grupos de Whatsapp e também aqui no Facebook.

Há quem diga, aqui no Brasil, que racismo é ilusão e/ou vitimismo de quem o denuncia. Há quem queira acabar com o Dia da Consciência Negra ‘argumentando’ que celebrar tal dia é ‘racismo contra os brancos’ e que somos ‘todos iguais’. Há quem escreva livro afirmando que ‘Não somos racistas’ (claro que quem escreve isto é branco). Há, inclusive, quem manipule falas e vídeos de defensores dos direitos das pessoa negras para insinuar que quem está ao lado da comunidade negra é que é racista. Mas a verdade está aí, como denuncia a Rafaela neste vídeo.

O racismo é fato no Brasil e ele é sistêmico, socialmente partilhado e socialmente produzido, e por isso ele tem que ser enfrentado de forma sistemática por meio de leis e políticas públicas articuladas pelos entes da federação – a União, os estados e os municípios – sempre em diálogo com os movimentos e outros atores sociais. E por meio de discursos que reconfigurem o imaginário dessa população em relação aos negros e negros do nosso país. Esse é um papel de todos nós!