Quem se lembrará da dor de Dinalva, mãe do garoto assassinado no Extra? Por Nathalí Macedo

Atualizado em 25 de fevereiro de 2019 às 20:17
Dinalva sofre a perda do filho

“Ele levantou, olhou de lado, olhou pra mim e disse: ‘agora coloca as pernas dele pra cima’. Meu filho já tava…um corpo imóvel.”

Este é um trecho do relato de Dinalva, 35 anos, sobre o dia em que assassinaram seu filho, Pedro Henrique, diante de seus olhos.

Ela contou ao Fantástico no último domingo detalhes do estrangulamento. Só não se sente profundamente tocado quem não está vivo.

Antes de ser assassinado, Pedro Henrique passou mal e caiu. Ele era usuário de drogas e possivelmente teve um surto. Foi em direção ao segurança para pedir ajuda, e Dinalva também pensou que o auxílio viria de onde só veio a violência.

“Eu fiquei até mais tranquila, o segurança vai me ajudar. Se meu filho tiver tendo um surto, a ambulância vai chegar, e vai acudir meu filho.”

Triste esperança.

Tanta inocência chega a ser pungente. Uma mulher que se atreve a acreditar na humanidade e acaba vendo o próprio filho assassinado por outro dito ser humano.

O pior é que o dia que foi o pior pesadelo de Dinalva – uma pessoa que sofre, ri e sente dor, como eu e você -, foi para o Brasil apenas mais uma notícia sobre as tantas barbaridades que os seres humanos fazem uns com os outros, que já foi esquecida para dar lugar a outras barbaridades que a sucederam e precisavam ser noticiadas.

Aí danaram a discutir boicote ao Extra. Tentaram chegar em um consenso sobre a cor da pele do garoto. Especularam sobre o posicionamento político do segurança. Todo mundo queria opinar, e muitos  apresentaram teorias e problematizações conclusivas, mas certamente esqueceram de sentir.

A dor de Dinalva, no meio disso tudo, permanecia invisível: chegamos a tantas conclusões que não deu tempo de abraça-la.

Todos os debates levantados em torno do caso – levantados inclusive por mim – são muito válidos, justos e necessários: a questão racial, a reincidência do assassino, condenado por agredir a ex-companheira, e a falta de compaixão das pessoas que choraram a morte do cachorrinho do Carrefour.

Acontece que, por trás das manchetes e da discussão identitária, é preciso falar sobre a falta de humanidade que nos assola. É preciso falar sobre a falta de amor, mas tem sido difícil, porque ninguém mais ouve, porque está fora de moda falar sobre isso. Ninguém lacra falando de amor, afinal.

Ainda assim acho necessário dizer que a dor de Dinalva nos diz respeito. A dor de perder um filho, que é frequentemente descrita como similar a perder um pedaço de si mesma, e que ficou abafada pelos holofotes que toda boa história de violência e brutalidade atrai.

Dinalva provavelmente nunca mais sorrirá como antes e sua vida nunca mais será a mesma, e quem pensa, em algum momento, que a dor de um ser humano não afeta os outros seres humanos, certamente esquece que a humanidade é uma só máquina, e todas as engrenagens importam para que o todo funcione bem.

Essa é, para mim, a verdadeira empatia: sensibilizar-se pelo outro por saber que, de alguma forma, você é o outro.

Quem se lembrará da dor de Dinalva? E quem pensará, daqui a algumas semanas ou meses, que todos nós, humanidade, vivemos em um mundo em que uma mãe espera que o segurança auxilie seu filho, e ele o estrangula?

Quem continuará chorando a morte de Pedro Henrique?

Dinalva. Apenas Dinalva.