O governo liderado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está empenhado em eliminar as oportunidades exploradas por investidores estrangeiros baseados em paraísos fiscais e possuidores de criptoativos no Brasil, incluindo as criptomoedas, visando evitar a evasão fiscal.
As iniciativas serão incorporadas a um projeto de lei destinado a modificar o regime tributário de aplicações financeiras, uma iniciativa anunciada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que será encaminhada em breve ao Congresso Nacional.
De acordo com a Folha de S.Paulo, o objetivo principal do Executivo é simplificar e consolidar as regras tributárias referentes a investimentos em títulos, valores mobiliários e operações na Bolsa, bem como ao investimento estrangeiro nessas áreas.
Embora as alíquotas permaneçam inalteradas, algumas modificações podem resultar em aumentos na arrecadação para o governo federal. No entanto, estima-se que o impacto seja neutro, uma vez que os investidores podem ajustar suas estratégias diante das alterações. Caso sejam aprovadas pelo Congresso ainda este ano, as novas regulamentações entrarão em vigor a partir de 2025.
Atualmente, a legislação brasileira isenta investidores estrangeiros do pagamento do Imposto de Renda sobre rendimentos provenientes da Bolsa e aplica uma alíquota reduzida de 15% sobre outras formas de investimento, uma política que permanecerá para promover o ingresso de recursos no país.
Entretanto, essa isenção não se aplica a residentes em paraísos fiscais, que estão sujeitos a uma alíquota de até 22,5% em todas as modalidades de investimento.
Os paraísos fiscais são definidos como jurisdições que oferecem isenção ou tributação inferior a 20% sobre a renda, ou que têm normas de divulgação de informações empresariais pouco transparentes. Essa lista engloba 61 países ou territórios, incluindo Bermudas, Ilhas Virgens Britânicas e Ilhas Cayman.
No entanto, a questão é regulada apenas por instruções normativas da Receita Federal, enquanto a legislação que trata do Imposto de Renda sobre aplicações financeiras é vaga e não menciona explicitamente países que garantem sigilo de informações. De acordo com especialistas do governo, essa lacuna legal tem criado uma “zona cinzenta” que dificulta a fiscalização.
O projeto de lei pretende esclarecer que países que não oferecem transparência de informações também são considerados paraísos fiscais. O objetivo é fornecer uma base legal sólida e conter investidores desses países que movimentam recursos para o Brasil.
O governo considera essa medida como o último passo após obter aprovação do Congresso para fechar brechas anteriormente utilizadas por brasileiros que mantêm fundos em paraísos fiscais. Além disso, o governo planeja aprimorar outras regras relacionadas a paraísos fiscais, especialmente em relação às incertezas legais quando um país é adicionado ou removido da lista.
Por exemplo, em 2016, a Receita Federal incluiu a Irlanda na lista de paraísos fiscais, resultando em uma tributação mais alta para seus residentes em investimentos no Brasil. No entanto, havia incerteza sobre a tributação de ganhos anteriores.
O projeto de lei estipula que a lista da Receita seja definitiva e só tenha efeitos após a data de publicação, ou seja, a tributação se aplicará apenas aos rendimentos obtidos após a inclusão explícita do país. Rendimentos anteriores permanecerão isentos.
O mesmo princípio se aplica quando um país é removido da lista de paraísos fiscais. Por exemplo, em 2014, a Suíça foi retirada dessa lista. Embora alguns contribuintes busquem uma aplicação retroativa da isenção, a lei determina que todos os rendimentos anteriores à exclusão continuem sujeitos à tributação.
O governo também pretende fechar uma lacuna utilizada por investidores estrangeiros (de qualquer país) para evitar o pagamento do Imposto de Renda quando mudam o tipo de investimento.
Atualmente, quando um investidor estrangeiro migra de um investimento direto para ações na Bolsa, a tributação sobre os ganhos anteriores à mudança é contestada judicialmente. O projeto de lei prevê a cobrança retroativa sobre esses ganhos.
Além disso, o governo planeja regular a tributação de criptoativos no Brasil, como o bitcoin, que atualmente não possui legislação específica. Embora a Receita Federal tenha emitido uma instrução normativa aplicando a esses ativos virtuais as mesmas regras de tributação sobre ganhos de capital, especialistas consideram essa abordagem falha, pois isenta a venda de bens de pequeno valor.
O governo identificou que detentores de criptoativos têm se aproveitado dessa isenção para realizar operações abaixo desse limite e evitar o pagamento de impostos. Para corrigir esse problema, o governo propõe aplicar as mesmas regras de tributação das aplicações financeiras (com alíquotas de até 22,5%) sempre que os criptoativos representarem uma aplicação financeira.
Essas mudanças são vistas como essenciais para garantir a tributação adequada e manter a equidade entre os contribuintes, especialmente diante da tributação de criptoativos no exterior. Além disso, o projeto de lei contempla outras mudanças destinadas a simplificar e corrigir distorções no sistema tributário.
Atualmente, os investidores da Bolsa devem calcular mensalmente seus ganhos e perdas para pagar o imposto devido, com isenção para vendas de até R$ 20 mil. O projeto de lei propõe que esse cálculo seja feito trimestralmente, com aumento proporcional da isenção para R$ 60 mil.
Além disso, o texto cria condições para que os investidores utilizem a ReVar, uma calculadora da Receita Federal para apurar o imposto devido sobre ganhos com renda variável, visando corrigir erros de cálculo decorrentes da complexidade. O governo espera que essas medidas eliminem obstáculos ao aumento significativo de recursos na Bolsa.
Por fim, outra mudança visa eliminar a chamada “barriga de aluguel”, uma prática na qual um fundo de investimento, sujeito a uma alíquota menor de IR, temporariamente recebe ações de outro fundo sujeito a tributação maior, visando reduzir o imposto sobre os ganhos. O projeto de lei fecha essa brecha e busca garantir a cobrança do tributo devido.