Platão cantou Sócrates.
Boswell cantou Samuel Johnson.
Clóvia Rossi canta o seu Frias.
Vi, no iPad, parte do material com que a Folha festejou os seus 90 anos. Lembro bem a comemoração dos 60 anos, no começo da década de 1980. A Folha chegou a contratar o historiador Carlos Guilherme Motta para escrever a história do jornal. A sensação era de véspera de festa. Agora, em plena Era Digital, a impressão que se tem na celebração é que se trata de fim de festa.
Também se deve ter em conta que o jovem Otávio Frias Filho, que se preparava então para dirigir o jornal, é hoje, como eu, um cinquentão. Depois de cerca de 10 000 manchetes tudo parece se repetir na vida de um editor hereditário.
Na cobertura dos 90 anos, o artigo de Clóvis Rossi sobre seu Frias me chamou particularmente a atenção.
Será que Rossi acredita mesmo que Frias tenha sido jornalista e não empresário apenas? Não só um jornalista, de resto, mas um grande jornalista? Não desconsidero a possibilidade de que de alguma forma ele é convidado ou convocado para falar do ex-patrão basicamente as mesmas coisas de sempre, numa repetição automática e servil que rebaixa Rossi sem elevar Frias.
Rossi cita “furos” de Frias como se Frias fosse Assange do Wikileaks.
No artigo de hoje, ele diz com aparente admiração que Frias soube antes que Gustavo Franco iria sair do Banco Central. Furo isso? Os donos de empresas têm contatos frequentes com gente do poder. É natural que saibam coisas como uma demissão iminente. Certamente a secretária de Gustavo Franco também sabia de sua saída.
Que mérito há nisso?
Compare com a divulgação do vídeo em que soldados americanos matam civis numa rua do Iraque.
A doença de Tancredo é também descrita sempre por Clóvis Rossi como um “furo” de Frias. Só rindo.
Curioso também que num contraponto que faz entre o jornalista Claudio Abramo e Frias o primeiro é chamado de “esquerdista” e o segundo não de “direitista”, mas de defensor da livre iniciativa.
Rossi é um bom repórter.
Se fizer esforço, vai provavelmente encontrar motivos melhores para a bajulação que, de tempos em tempos, promove monocordicamente do seu antigo patrão.