Levantamento do UOL traz, nesta segunda (3), o ranking dos salários nominais de governadores dos estados. Os números produzem, ao menos, três perguntas: qual o valor justo a ser pago a um gestor de uma unidade da federação e a seus secretários? Como garantir limites e transparência? E em um momento em que governos dizem a servidores, como professores, que não há grana para reajuste, aumentar remunerações de governadores e seus assessores diretos não é um péssimo exemplo?
Os valores trazidos pela reportagem vão dos R$ 20.629,59 pagos a Elmano de Freitas (PT), no Ceará, até os R$ 42.145,88 a Raquel Lyra (PSDB), de Pernambuco – sendo que esta última recebe como procuradora do Estado, cargo do qual se licenciou ao assumir.
Vale lembrar que o teto no serviço público é o subsídio a ministros e ministra do Supremo Tribunal Federal, que hoje recebem R$ 44.008,52.
A definição da remuneração precisa levar em conta a capacidade financeira do estado (há unidades com forte aperto financeiro e demandas emergenciais que demandam mais orçamento) e o tamanho do desafio dos gestores (às vezes, é muito mais fácil administrar um estado mais rico do que um muito pobre).
Mas a remuneração dos 27 governadores não seria um problema em si, tampouco o aumento que tire a defasagem – um salário de R$ 9,6 mil mensais, como era o dos governadores de Pernambuco até o fim de 2022 era algo a ser corrigido. E uma pessoa não faria diferença. O efeito cascata que aumentos salariais da cúpula dos poderes causam nos altos escalões da União, dos estados e dos municípios é que precisa ser analisado com cuidado.
Pressões para aumento no valor pago aos governadores vem, não raro, de sua equipe, cuja remuneração oficial não pode ultrapassar às dos chefes. Com isso, não são poucos os estados que colocam secretários em conselhos para ganhar um jetom, ou seja, fazer um cascalho a mais. Mesmo que os profissionais não tenham nenhuma familiaridade com o tema do conselho.
Por exemplo, em São Paulo, o jornal Folha de S.Paulo mostrou que o secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, além do salário, recebe mensalmente R$ 6.581,79 como conselheiro fiscal da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). E também faz parte do conselho do Metrô, recebendo o mesmo valor. Como é deputado federal licenciado, preferiu continuar recebendo o salário da Câmara, que é de R$ 44 mil em vez dos R$ 31,1 mil do secretariado estadual – valores brutos.
No Maranhão, o reajuste no salário do governador não ocorreu durante os oito anos de Flávio Dino e no primeiro ano de Carlos Brandão (PSB), por exemplo. Para melhorar o salário, secretários e outros membros da equipe recebiam jetons em conselhos. A Assembleia Legislativa aprovou o aumento de R$ 15.915 a R$ 33.006,39 para governador.
A justificativa costumeiramente dada é que a manobra, também adotada com ministros no governo federal, permite trazer bons profissionais trocarem a iniciativa privada pelo poder público. Ressalte-se, contudo, o risco desse argumento. Se alguém quer fazer pé de meia, deveria ficar na iniciativa privada. Além disso, muitos desses profissionais já eram servidores públicos e ganhavam bem menos que seus cargos atuais.
Ao longo dos anos, temos visto salários de governadores serem reajustados e, com eles, os de secretários, mas o pagamento por participação em conselhos a secretários serem mantidos. Ou seja, acabam se tornando penduricalhos.
Há uma discussão sobre diferenças de remuneração que precisaria ser analisada com seriedade, ou seja, longe da superficialidade do debate ultrapolarizariado. Deputados federais e senadores ganham mais que governadores, apesar de serem eleitos pelos estados, sendo pagos com orçamento federal. A federação brasileira é maluquete. Mas há outra que diz respeito às alternativas que foram sendo construídas ao longo do tempo para melhorar a remuneração de secretários estaduais e mesmo de ministros. Essa acochambração é o melhor que podemos fazer?
Por fim, uma questão importante: claro que os salários de governadores e secretários totalizam muito pouco se comparados ao orçamento dos estados e do Distrito Federal. Dizer que esses aumentos vão quebrar as unidades da federação é um populismo que ofende a inteligência. Mas a questão é o velho “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”, ou seja: gestores negarem demandas justas da camada do funcionalismo que ganha pouco e aceitarem a da cúpula do funcionalismo. Isso passa um recado ruim, de descolamento da realidade.
Publicado originalmente na coluna do autor no UOL
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