Por Samuel Braun
Não se engane, liberalismo é isso.
Ontem mencionei que as medidas orwellianas de Mikei eram propostas liberais normais. Alguns reclamaram que nada tinham de normais. Mas não puderam retrucar que eram liberais. E meu ponto é esse: o liberalismo é isso, e normalizamos isso.
Milei é um liberal de fina formação, economista altamente versado em todas as obras do liberalismo, chefiou bancos e foi contratado pelas sacrossantas agências de riscos, que tem o poder divino de dizer que países tem nota A ou Z.
O liberal Milei se destacou tanto defendendo as ideias econômicas que hoje aplica que chegou a trabalhar pro Banco Mundial, recebendo o poder de dizer quais países mereciam ou não empréstimos internacionais. Por fim, a imprensa liberal o criou publicamente como analista crítico da esquerda – exatamente como também faz a mídia liberal brasileira.
A senhora Mondino igualmente é uma liberal letrada, das mais reverenciadas na Argentina, professora de uma faculdade particular que é a Meca do liberalismo lá (Insper daqui?). Tal qual Milei, vive na TV argentina criticando as políticas econômicas de esquerda.
Agora como chanceler decidiu ser a voz de uma das mais bizarras políticas liberais: a desmonetização da economia nacional. Como Milei, vê o Estado como um problema pra economia, pois tolhe a LIBERDADE dos agentes econômicos individuais. O que mais liberal que isso? Exatamente, é um pensamento essencialmente liberal.
Milei e Mondino derivam dessa aversão ao Estado a aversão à criatura do poder estatal, a moeda. Os liberais rejeitam e falsificam a história para negar que a moeda seja ferramenta do Estado, mas sabem que é, e por isso são entusiastas de aboli-la por arranjos “livres”: criptoativos (erroneamente chamados de criptomoedas) ou qualquer ‘meio de troca’.
Quando Milei promete dolarizar a economia argentina o faz por apego teórico a esse abandono da ferramenta estatal. Seu ódio pelo Banco Central não é só porque foi de lá demitido, mas porque o BC personifica esse poder estatal, a emissão monetária. De quebra submete em definitivo o país à soberania monetária estadunidense.
A economista liberal Mondino faz questão de enaltecer a proposta de abandono da moeda – qualquer moeda – na Argentina. É um corolário do abandono do Estado como óbice à mão invisível do mercado. Por isso ela defende que se adote o escambo, trocando coisas até por leite, desde que se deixe de lado a ferramenta do Estado, a moeda.
Surreal? Surrealmente liberal, isso sim. Um liberalismo tão atroz que contraria a história do capitalismo, que nada mais é que a história dos privilégios exorbitantes garantidos aos capitalistas pelos Estados através da moeda e da guerra.
Mondino é retratada pelos entrevistados liberais da Folha e do UOL como moderada, razoável, normal. E no meio liberal ela é. Como Milei, sempre normalizado nos meios liberais. Suas ideias são essencialmente liberais.
Como disse no post anterior, as ideias liberais são essencialmente concentradoras de renda e contracionistas no agregado. Essas são as repercussões macroeconômicas das ideias liberais, por isso geralmente elas são omitidas e apresentadas pela sua perspectiva microeconômica. Da perspectiva individual fazem sentido, coletivamente são desastrosas.
Por isso, prejudiciais à maioria, e assim, irracionais para serem adotadas pela maioria da população. É por isso que (1) ou são aplicadas diluídas e apresentadas com desculpas microeconômicas ou (2) em conjunto, deixando claro seu impacto macroeconômico nocivo, através da imposição pela força.
Não se enganem, o que a Argentina está experimentando não é nada além do liberalismo. Quando chamam de “ultraliberalismo” querem fazer parecer uma outra coisa, mas na verdade é a mesma – por isso o mesmo radical – com um prefixo de intensidade.
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