Se algo merece ser chamado de rock no Rock in Rio, é o show de Bruce Springsteen

Atualizado em 2 de outubro de 2014 às 16:47
MUSIC: BRUCE SPRINGSTEEN IN CONCERT IN MILAN
Ele

Bruce Springsteen faz, hoje, o maior show de rock no mundo. O mais longo, o mais intenso: pelo menos três horas de duração. Ele sabe das coisas. Nos espetáculos no Brasil, tem tocado uma versão incrível de “Sociedade Alternativa”, o hino hippie de Raul Seixas e Paulo Coelho. Conseguiu decorar a primeira estrofe e não teve dúvida. Dane-se o sotaque. Fez a mesma coisa na Argentina e no Chile, onde interpretou Mercedes Sosa e Victor Jara, respectivamente.

“Eu quero uma experiência extrema”, ele diz. “Eu quero que a plateia vá embora com as mãos doendo, os pés doendo, as costas doendo, a voz rouca e os órgãos sexuais estimulados”.

Aos 63, Bruce dá um duro desgraçado no palco, martelando sua Fender Telecaster com seu estilo característico, contando suas histórias de gente comum. “Nos últimos 30 anos, eu tenho escrito sobre a distância entre o sonho americano e a realidade americana”, afirma. Está experimentando um bom momento. A turnê Wrecking Ball, nome do último disco, foi a segunda mais vista nos EUA no ano passado.

Bruce sempre cantou sobre temas adultos. Ao contrário de, digamos, Dinho Ouro Preto, que tem 13 anos, envelheceu com seu público. Quando lançou o primeiro álbum, Born To Run, em 1975, foi comparado a Bob Dylan. Suas grandes influências são artistas engajados como Woody Guthrie, Hank Williams e Dylan. Nos anos 80, virou um popstar. “Born In the USA” chegou a ser usada por Ronald Reagan. Springsteen teve de sair em defesa da música, declarando que o presidente não tinha entendido nada.

A E Street Band, que o acompanha desde o começo, é formada na verdade por músicos assalariados. Ali está o melhor amigo, o guitarrista e figuraça Steve Van Zandt, e a mulher Pattie Scialfa. O saxofonista Clarence Clemons, colega de Bruce desde os anos 70, morreu no ano passado. Bruce fez uma elegia bonita no funeral.

Em 1974, o crítico Jon Landau, produtor musical frustrado, estava em crise existencial. Foi assistir a um show de Bruce Springsteen. Na volta, escreveu a resenha mais famosa da história do rock. “Na quinta passada, no Harvard Square theater, eu vi o passado do rock’n’roll desfilar diante dos meus olhos. E eu vi algo mais: eu vi o futuro do rock’n’roll e ele se chama Bruce Springsteen. E numa noite em que eu precisava me sentir jovem, ele fez com que eu me sentisse ouvindo música como se fosse a primeira vez”.

Bruce é quem incorpora com mais legitimidade o espírito do rock’n’roll num festival corporativo, parecido com uma convenção gigante de vendas. Quando está no palco suando, fazendo o número de fingir que está exausto para se levantar em seguida, parece que o rock’n’roll serve a um propósito mais elevado. É apenas ilusão, claro. Mas, por uma noite, está ótimo.