Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.
O principal assunto da última sessão da CPI da Sabesp na Câmara de SP foi o aumento das tarifas de água em 15,24% por determinação de sua agência reguladora, a ARSESP, que é controlada pelo governo estadual.
Mas o que sobrou, ali, foi a sensação que de os paulistas estão com problemas sérios por uma falta completa de rumo de quem deveria saber o que está fazendo. A comissão fez alguns elogios ao novo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, comparando-o a sua antecessora.
“Foi um parto para trazer a ex-presidente Dilma Pena para esta casa. Hoje sentimos uma confiança maior da parte de vocês e vemos todos os riscos evitáveis. A questão que eu vejo como problemática é a participação da iniciativa privada. Temos o caso da abertura de ações no Brasil e em Nova York. Há possibilidade de distribuição de dividendos dos lucros neste ano?”, perguntou o presidente da CPI, vereador Laércio Benko (PHS).
Kelman tergiversou e respondeu com a maior cara de pau: “A Sabesp é uma empresa aberta e transparente. O salário dos executivos da Sabesp é público, girando na casa de 20 mil reais. Não entro no mérito se o ganho é alto ou baixo, mas é grande sim perto do restante da população de São Paulo. No entanto, é um salário compatível com uma empresa com valor de mais de 10 bilhões de reais, que é a melhor fornecedora de água e saneamento do país”.
Como é a melhor fornecedora com seu maior reservatório seco? Culpa de São Pedro?
Acredite, esta foi uma das boas respostas de Kelman naquela manhã. Ele falaria absurdos diante de questões mais delicadas.
O relator do processo da CPI, Nelo Rodolfo (PMDB), levantou uma questão política dentro da crise da Sabesp, que liga diretamente ao governador tucano Geraldo Alckmin. “A conclusão do meu relatório, presidente, é que a população está pagando a conta da crise. Nós pagamos a Sabesp e é o próprio estado que nos cobra aumento de tarifas, através de sua agência reguladora ARSESP. O que o senhor acha disso? É correto um órgão do governo estadual fiscalizar a Sabesp, que tem participação do mesmo governo?”, perguntou.
Nelo Rodolfo estava se referindo aos apelos malucos do direito metropolitano Paulo Massato, que mandou as pessoas fugirem para as montanhas.
“Sua pergunta se relaciona com a natureza das agências reguladoras. Fui presidente da ANA, Agência Nacional de Águas, e de Energia Elétrica. Os presidentes têm mandatos e não podem ser expedidos pelo governador. Eu acho que a agência tem independência, pois nós da Sabesp não achamos justo este aumento de apenas 15%, nós pedimos 22,7%. Não queríamos uma tarifa nesse patamar por um capricho”, disse Kelman, usando a própria biografia como blindagem para não entrar na discussão política.
Em nenhum momento da sessão a Sabesp se manifestou sobre a participação majoritária dos governos do PSDB em sua gestão. E nem mencionaram como Alckmin se manteve negando a natureza da crise.
Tudo é responsabilidade do custo da energia, que teria disparado o suficiente para que não houvesse opção a não ser cobrar mais da população.
Laércio Benko ressaltou o óbvio dentro do raciocínio louco da empresa: “Talvez fosse melhor para a Sabesp passar por um período de prejuízo diante de uma crise desta magnitude, pelo bem da população”.
Jerson Kelman defendeu os lucros dos acionistas como uma forma de capitalizar a empresa e fazer os investimentos necessários. O presidente também foi contundente com a possibilidade de um racionamento mais radical.
“Não haverá rodízio em 2015, mesmo considerando as piores previsões de seca. Tomamos as medidas necessárias para diminuir a dependência da população em relação ao Cantareira. A reserva da Guarapiranga, por exemplo, está num patamar de 80%”.
Por que ele precisa apresentar correndo o número de outros reservatórios se o seu maior sistema, que abastece até 70% da cidade de São Paulo, está em 20% e recorre ao volume morto? Desespero?
Parece que sim. Depois da sessão na Câmara, Kelman deu entrevista coletiva à imprensa. Repetiu toda a sua cartilha de desculpas: negou que a Sabesp tenha um plano B de rodízio, caso tudo piore, resumindo. E deu uma resposta muito confusa a uma jornalista que repetiu as mesmas perguntas na coletiva de imprensa, após a reunião da Câmara.
“Uma coisa são os pedidos que a Sabesp fez durante a crise e outra coisa é o que os órgãos reguladores determinaram durante a crise. A previsão de interligações é para o mês de setembro e, bem, se tiver um terremoto as coisas ficarão graves, mas não há motivo pra acreditar nisso agora”, disse o presidente Kelman sem explicar de fato como estão cuidando das obras para reformar o abastecimento das reservas da Cantareira.
O que um terremoto tem a ver com as obras para combater a crise hídrica?
Deus nos proteja.