O Brasil persegue há décadas o objetivo de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, condição exclusiva de cinco potências nucleares – China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia.
Para integrar este seleto clube de poder do sistema mundial que tem o poder de iniciar e terminar guerras e conflitos o Brasil precisa, porém, mais do que uma política externa ativa e altiva e de pragmatismo diplomático.
Tampouco é suficiente a empatia angariada mundo afora por meio do imenso talento político-diplomático do presidente Lula e da defesa das bandeiras generosas de um mundo com justiça, paz, igualdade e sem fome.
Sem uma capacidade avançada em termos de Defesa Nacional, o que significa a conformação de um poder dissuasivo convincente ante potenciais agressores externos, o Brasil não conseguirá exercer uma influência decisiva no sistema de nações. Menos ainda em circunstâncias de conflitos bélicos e guerras.
Manda no mundo quem tem poder. E tem poder o país quem tem dinheiro, força corporativa e capacidade bélico-militar para impor sua hegemonia e domínio e, também, para desencorajar intentos de ataques de estrangeiros.
Robustecer o poder dissuasório não significa a opção de guerrear e de agredir outros países, mas o esforço de constituir mecanismos confiáveis de defesa da soberania nacional.
Desse ponto de vista, no entanto, o Brasil está indefeso, despreparado e totalmente vulnerável à mínima investida de algum país estrangeiro.
No livro O que fazer com o militar, anotações para uma nova defesa nacional, o historiador Manuel Domingos Neto diagnostica que “as Forças Armadas brasileiras são organizações despreparadas para negar os espaços terrestre, marítimo, aéreo, cibernético e espacial à potência estrangeira medianamente habilitada. São grandes aparatos dispersos, dispendiosos, multifuncionais e ineficientes para o combate da atualidade”.
É notório o despreparo militar brasileiro nas cinco dimensões de guerras contemporâneas – além das clássicas dimensões terrestre, marítima e aérea, também nos planos cibernético e espacial nos quais se desenrolam as confrontações modernas e as guerras híbridas.
A dependência tecnológica externa, principalmente dos EUA; ao lado do emprego equivocado no combate ao “inimigo interno” via operações de Garantia da Lei e da Ordem, ocupa as Forças Armadas em funções de vassalagem, e as afasta da missão de defender o país.
Na visão de Manuel Domingos Neto, o país “dependente de compras de material estrangeiro é caudatário das decisões de seu fornecedor. Está condenado ao papel de marionete. Ousando agir por conta própria, será frágil diante de outro com menos soldados, mas com relativa autonomia”.
O desejo brasileiro de sentar-se na mesma mesa dos poderosos possuidores de arsenal nuclear e de armas sofisticadas não se materializará sendo o Brasil subordinado militarmente e doutrinariamente aos EUA e tecnologicamente dependente da potência imperial e de outras potências.
O esforço de protagonismo ambicionado pelo Brasil no concerto das nações dificilmente será retribuído sem uma estratégia de defesa nacional autônoma, independente e sofisticada. E esta estratégia está cada vez mais distante do horizonte devido às escolhas do governo Lula no concernente aos militares.
O governo repete o erro de ocupar os fardados em missões policiais e de segurança pública, desviando-os da missão precípua que deveriam desempenhar. E continua concedendo autonomia para as cúpulas fardadas atuarem como um governo dentro do governo.
Os comandantes exercem uma “diplomacia militar” própria, alheia aos posicionamentos do governo brasileiro, como demonstraram na guerra na Ucrânia. Promovem treinamentos em território nacional justamente com aquelas forças estrangeiras que representam maior potencial de agressão ao país.
E exercem uma autonomia absoluta para consumirem R$ 87 bilhões por ano do orçamento da Defesa Nacional em grande medida sem critério republicano –82% do orçamento de 2022– para pagamento de pessoal, sendo a maior parte relativa a pensionistas e filhas de militares.
O governo reforçou o “mundo paralelo” dos militares concededendo-lhes R$ 52,9 bilhões das verbas do PAC sem estabelecer os projetos fundamentais à luz da estratégia de defesa nacional. Corre o risco de ver esta dinheirama drenada para desvios, caprichos, negócios escusos e mais regalias corporativas.
Ao invés de encomendar a atualização da Política Nacional de Defesa e da Estratégia Nacional de Defesa a especialistas civis em assuntos militares e de defesa, o governo entregou esta tarefa tão sensível para o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas [Decreto 11.720 de 29/9/2023].
Para conquistar o espaço que tanto almeja no jogo de poder mundial, é essencial o Brasil investir na Defesa Nacional desde a perspectiva do poder político e da sociedade civil. Para materializar este objetivo, o governo precisa enfrentar decididamente a questão militar.
Publicado originalmente no blog de Jeferson Miola