Publicado originalmente no Brasil de Fato
Por Igor Carvalho
Em entrevista ao Brasil de Fato, o senador Major Olímpio (PSL-SP) afirmou que a participação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nos debates eleitorais em 2018 era motivo de preocupação de sua equipe de campanha, por conta do despreparo do então candidato para lidar com os temas nacionais.
“Era um desespero nosso, cada dia uma agonia, era isso mesmo. Ele não se preocupava em se preparar. Para disputar uma eleição presidencial, você precisa apresentar um projeto do que você quer fazer para o país. Terminou a eleição e nós não tínhamos um projeto para o país”, explica o senador, que era candidato ao Senado em 2018 e coordenava a campanha de Bolsonaro em São Paulo.
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Em 2018, o capitão reformado participou de apenas dois debates eleitorais, na Band e na RedeTV, este último em parceria com a revista IstoÉ.
Em 22 de agosto daquele ano, 14 dias antes da facada sofrida por Bolsonaro, Gustavo Bebianno, então presidente do PSL e coordenador nacional da campanha de Bolsonaro, anunciou que o candidato estava fora dos debates. Depois disso, apesar da liberação dos médicos, Bolsonaro não participou mais dos encontros com os demais presidenciáveis.
Sérgio Olímpio Gomes já passou por diversos partidos, como PDT, PV e Solidariedade. Entrou para a política em 2006, quando se elegeu deputado estadual em São Paulo, mesmo ano em que se aposentou na Polícia Militar. O senador defende pautas controversas, como o armamento do “cidadão de bem” e chegou a escrever um livro, “Reaja – Prepare-se para o confronto. Técnica israelense de combate”, em que ensina a manusear armas.
A base política dele são policiais militares, que defende mesmo em situações condenadas por entidades de direitos humanos. A defesa dos agentes fez com que o senador fosse opositor aos seguidos governos do PSDB em São Paulo, insatisfeitos com questões salariais. O mais recente, João Doria, chegou a ser ameaçado fisicamente pelo senador.
O Brasil de Fato procurou o presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro, o deputado estadual Eduardo Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro, para que comentassem as acusações. os assessores do presidente e do senador não responderam até o fechamento da matéria e os de Eduardo e Carlos, não foram encontrados.
Confira a entrevista na íntegra:
Brasil de Fato: Por que o senhor rompeu com Jair Bolsonaro?
Major Olímpio: Ele queria que eu retirasse a assinatura de um pedido da CPI da Lava Toga, para apurar as condutas do Supremo e eu compunha o grupo Muda Senado, Muda Brasil, de senadores independentes. Ele me procurou, pedindo para que eu saísse desse grupo. O filho dele, o senador (Flávio Bolsonaro), ligou para as duas senadoras do PSL (Selma Arruda – que foi cassada – e Soraya Thronicke) dizendo todas as impropriedades e palavrões possíveis a elas, para que retirassem as assinaturas.
Elas me ligaram assustadas com o destempero e agressões. Eu liguei para o Flávio para saber o que estava acontecendo e começamos a discutir. O pai, então, pegou o telefone e seguimos discutindo. Aí se deu nosso rompimento. Agora, me afastei de vez, com os escândalos do Queiroz e do Gabinete do Ódio, que são pessoas ligadas ao gabinete mesmo, que vivem para promover agressões contra qualquer um que possa manifestar discordância do presidente. Fui e continuo sendo atacado por esses criminosos. Essa questão moral do presidente com o Queiroz está ficando cada vez mais claro, que ele era um tesoureiro de quatro gabinetes, do presidente e seus familiares, coordenando um caixa geral, que toma dinheiro de funcionários.
O senhor se arrepende da aliança que formou com Bolsonaro?
Hoje, estou desiludido com a política, pelo que estou vendo acontecer. Eu também fui enganado, não imaginava esse super esquema do Queiroz, por trás da estrutura da família, eu realmente não imaginava.
Ainda no princípio da investigação, eu achava que era uma conduta apenas do Flávio, mas não. Isso é crime de peculato, é extorsão de funcionário, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e organização criminosa, isso é uma coisa que desilude e desanima. Eu acreditei demais na causa, por isso me desiludi demais.
Mesmo sendo próximo do presidente, o senhor não conseguia identificar esses sinais?
Não, esse negócio de flerte com o dinheiro, essa coisa no gabinete, não. O fato dele ser chucro, não querer mais de uma lauda de nada, eu vi o Paulo Guedes tentando dar dica de economia e como tinha dica de futebol, ele prestava mais atenção no jogo do que na dica que o Paulo Guedes estava passando. Isso nos preocupava demais, imaginar como seria o desempenho nos debates e entrevistas de televisão, isso nos dava agonia.
Havia, então, uma preocupação com a participação do Bolsonaro nos debates?
Era um desespero nosso, cada dia uma agonia, era isso mesmo. Ele não se preocupava em se preparar. Para disputar uma eleição presidencial, você precisa apresentar um projeto do que deseja fazer para o país. Terminou a eleição e nós não tínhamos um projeto para o país.
Aliás, nós estamos há um ano e meio de governo, se você me perguntar, por exemplo, qual o projeto para a Educação no país, não tem. Tivemos quatro ministros e nada, mais enrolação e contexto ideológico e nada.
Nem os colégios militares, que era a menina dos olhos do presidente, se viabilizou, que também não seria solução para a educação pública em um país de 215 milhões de pessoas. Começamos um governo sem ter um projeto para o país.
Se participasse dos debates, Bolsonaro teria sido eleito?
Eu acho que sim, pelo contexto da eleição.
Como o senhor vê a aproximação de Bolsonaro e seus filhos com milicianos e policiais com histórico de má conduta, como o capitão Adriano da Nóbrega?
O ex-capitão Adriano se tornou um criminoso e foi expulso da Polícia Militar do Rio de Janeiro e fez uma opção de se tornar um dos grandes chefes de quadrilha no Rio de Janeiro, eu não posso ser leviano de dizer que existam ligações familiares do presidente com milicianos.
Mas, me causa preocupação e estranheza que a mulher e a mãe desse criminoso compusesse, ao menos no papel, o gabinete do Flávio Bolsonaro.
O governo tem condições de se manter até 2022?
Isso depende do Bolsonaro, da conduta dele e dos que o cercam. O maior problema do governo hoje é o Jair Bolsonaro. Ainda bem que ele calou a boca depois da prisão do Queiroz, parou de dar aquelas coletivas no cercadinho quando sai e entra, melhorou bastante o clima no país.
Com ele acamado por conta da covid, as coisas vão andando. Se ele continuar calado, é possível que ele consiga terminar o governo. Dependendo, claro, de todas as investigações que estão correndo [contra a família].
Edição: Rodrigo Durão Coelho