Um excelente debate sobre algo que nunca existiu: a imparcialidade da mídia

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 17:16
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Rafucko

 

O videomaker, escritor, humorista e ativista carioca Rafucko é uma figura conhecida das manifestações no Rio de Janeiro. Está sempre presente nos protestos, fazendo intervenções. Caetano Veloso o chamou de “Cohn Bendit” de 2013.

Há alguns dias, Rafucko participou de um debate promovido pelo YouPix. O tema era: “Protestos e redes sociais – a mudança de poder da mídia”.

No palco, além dele, Pedro Doria (editor executivo de plataformas digitais do Globo), Rodrigo de Almeida (editor do iG), Alexandre Inagaki (jornalista e blogueiro), e Felipe, da Mídia Ninja do Rio. A mediação era de David Butter (jornalista com passagens pela Globo e G1).

Doria fez uma longa peroração sobre neutralidade e a diferença entre jornalismo tradicional — o que o Globo faria — e o engajado. Contou que foi para a rua na segunda-feira passada para “respirar gás lacrimogêneo” e “compreender os relatos dos repórteres”. Citou o vídeo de um cinegrafista de sua equipe, que flagrou um policial plantando um coquetel molotov na mochila de um jovem. Defendeu a objetividade e reclamou dos perigos de ter um crachá das organizações Globo. “A gente está apenas tentando descrever o que está acontecendo”, arrematou.

Ok. Provavelmente ninguém com mais de 12 anos acredita na imparcialidade jornalística — o que não significa que ela não deva ser buscada. “Deus, os jornais têm inventado histórias desde sempre”, disse Tom Wolfe. A Mídia Ninja é parcial, sim. A Globo não?

Rafucko estava preparado. Carregava uma edição amarfanhada do Globo de 17 de outubro: “Crime e Castigo – Lei Mais Dura Leva 70 Vândalos Para o Presídio”. Abriu para a plateia. “Esse é o jornal neutro, que não julga”, afirmou. Lembrou o mea culpa pelo apoio à ditadura. “Quando o jornalismo não executa o papel social que a imprensa deve exercer, ele tá fazendo ou propaganda, ou agindo como partido político”, disse. Foi aplaudido algumas vezes.

Doria se queixou das agressões a profissionais de canais de TV. “Quando manifestantes expulsam um jornalista, estão calando uma voz”, disse.

—  Não, eles estão repudiando a mentira, respondeu Rafucko.

—  Você classifica o que nós chamamos de fato, mentira.

—  Eu não, a Justiça. É a notícia de hoje. O Ministério Público liberou essas pessoas e arquivou inquéritos.

Pedro Doria ponderou, no final, sobre o exagero de falar em ditadura atualmente e da experiência de sua família no exílio nos anos de chumbo. O mediador foi hábil no tiroteio. O embate foi um microcosmo do que se vê nas ruas durante os protestos, com a Globo isolada. Doria devia ter alguma suspeita do que ia enfrentar e, diga-se, foi corajoso ao dar a cara a tapa.

Mas estava ali um fato contra o qual não havia argumentos: a capa do jornal e toda a história que ela continha. E, brandindo-a, um cara articulado, bem informado — e que tem respirado gás lacrimogêneo nos últimos meses.

Veja aqui a partir do minuto 25.