Um documentário com pouco mais de sete minutos ilustra porque a vitória de Raissa Santana no concurso Miss Brasil 2016 deve ser considerada uma conquista na luta pela representatividade negra.
Disponível no Youtube, “A Girl Like Me” repete um experimento realizado pelos psicólogos norte-americanos Kenneth Bancroft Clark e Mamie Phipps Clark nos anos 40 para verificar possíveis efeitos maléficos da segregação racial.
No teste, crianças negras responderam se preferiam a boneca preta ou a branca colocadas diante delas. Das 21 crianças pesquisadas no documentário, 15 preferiram as bonecas brancas, mesmo apontando para as pretas quando perguntadas sobre qual boneca se parecia com elas.
O resultado foi semelhante ao do experimento original.
Há outros vídeos mostrando testes idênticos promovidos no México, na Itália e no Brasil. Em comum a preferência pelas bonecas brancas e cenas comoventes de crianças negras apontando para a boneca preta quando questionadas a respeito de qual delas era malvada, para em seguida apontar para a mesma boneca quando a pergunta era com qual a criança se parecia.
O experimento sugere que a exposição ao racismo impregnado na sociedade possa afetar a autoestima desde os primeiros anos de vida, inclusive com manifestações de auto-ódio – confundidas com racismo por desavisados ou mal-intencionados.
Neste cenário onde crianças negras crescem odiando o próprio fenótipo, a presença crescente de negras como Raissa Santana e as outras cinco candidatas do concurso Miss Brasil 2016 em espaços com predomínio de pessoas brancas pode ajudar a reverter a situação.
Paranaense, Raissa foi a segunda negra a se tornar Miss Brasil. A primeira foi a gaúcha Deise Nunes, Miss Brasil 1986.
Com a fama e os contratos publicitários que virão, sua imagem irá circular e quem sabe ajudar meninas e mulheres a aceitar os cabelos crespos e seus tons de pele. É um poder que Raissa Santana e as outras misses negras têm e não pode ser subestimado.
Eleita mulher mais bonita do mundo pela revista “People” em 2014, a atriz Lupita Nyong’o disse que no passado pedia a Deus para acordar com a pele mais clara e só passou a ter uma percepção positiva a respeito da própria aparência quando conheceu o trabalho da modelo sul-sudanesa Alek Wek.
Desde a época em que Lupita fazia acordos com Deus até hoje surgiram outras modelos negras de destaque. Há negros na Casa Branca, negro cineasta vencedor de Oscar e negro campeão de Fórmula 1.
Ainda há muito a ser conquistado em termos de representação negra, mas já dá para ter a esperança de que no futuro o “teste da boneca” não repita os resultados cruéis vistos hoje em dia.