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Por Gilberto Maringoni
O empate uruguaio é inusitado na América do Sul: 48,74% contra 47,48%! É algo radicalmente diferente das projeções que apontavam uma vantagem entre 6 e 8% a Lacalle Pou, do Partido Nacional, sobre Daniel Martínez, da Frente Ampla.
Num continente em ebulição, tudo pode entrar em combustão sem aviso prévio. A segunda onda neoliberal, muito mais radical, autoritária e socialmente regressiva que a dos anos 1990 pode levar até mesmo um país que na última década e meia deu mostras de convivência democrática e tolerante entre diferentes a situações imprevisíveis. Ao longo de três governos da Frente Ampla, reduziu-se a pobreza, gorilas fardados foram parar nos bancos dos réus, tentou-se democratizar as comunicações, regular o uso da maconha e abriu-se caminho para conquistas de direitos humanos, como banir preconceitos raciais, sexuais e religiosos.
MAS CONTOS DE FADA NÃO EXISTEM. A economia cresceu a taxas anuais médias de 3,9% entre 2010 e 2014. Neste último ano, o PIB ainda se manteve em 3,2% em relação ao ano anterior. Impactado pelas crises do Brasil e da Argentina, a economia local – sem indústrias de monta – avançou apenas 0,4% em 2015 e a média daí até 2018 foi de 1,9%. Neste ano que se encerra, o indicador deve fechar em apenas 1% de crescimento.
O impacto na qualidade de vida, emprego e salários é imediato, o que contribuiu para um recuo nas preferências populares da Frente Ampla e alimentou o discurso oportunista da direita.
A FRENTE AMPLA venceu o primeiro turno por 39,02% a 29,62%. Era previsível que a direita fragmentada em várias candidaturas se uniria com largas chances de virar o jogo neste domingo (24).
A prudência da Corte Eleitoral em adiar o anúncio do resultado oficial e em reexaminar os chamados “votos observados”, de gente que votou fora de seu domicílio eleitoral, é mais do que acertada. Em discursos após a divulgação dos resultados quase finais, nem Lacalle Pou cantou vitória e nem Martínez baixou a cabeça em sinal de derrota. O candidato da Frente Ampla, aliás, pediu a seus apoiadores para evitarem “provocações nas ruas”.
NÃO É NADA, NÃO É NADA, mas a extrema-direita, que tudo indica atuar em rede na região, pode montar um cenário de caos e tentar embaralhar o jogo. Não é o mais provável, mas é possível.
As rebeliões populares no Chile, na Bolívia, no Equador, os protestos na Colômbia e a tensão crescente no Brasil indicam que não se deve brincar com fogo quando o mato está muito seco.