Vai a Paris? Então não veja a Mona Lisa

Atualizado em 29 de agosto de 2012 às 11:22
A vida corre do lado de fora dos museus

O Diário orgulhosamente apresenta seu novo colaborador: Jota Pinto Fernandes. Autor do livro Confissões de Um Turista Profissional (Editora Novo Conceito), Jota vai escrever sobre suas peripécias pelo mundo. Algumas das crônicas foram publicadas naquele livro ou na revista Viagem e Turismo. Jota conta aqui tudo o que os guias, as agências e aquele seu amigo que acabou de  voltar Nova York de pacote não contam.

 

O mago Paulo Coelho deu uma entrevista, certa vez, com dicas de como aproveitar uma cidade. Uma delas era: evite os museus. Isso diz muito sobre Coelho, mas não é sobre isso que eu quero falar. Dia desses, em Paris, mais exatamente no Louvre, ocorreu-me que talvez ele estivesse certo.

Não é só o fato de que a vida corre do lado de fora dos museus — nos parques, bares, restaurantes, casas, táxis, prostíbulos, metrôs etc. É que o museu não é uma espécie de poção mágica na qual você submerge sua cabeça e sai de lá mais culto ou inteligente (se não deu certo com o Coelho, que sabe das artes do oculto, não dará com você e eu). Diariamente, 25 mil pessoas vão ao Louvre. Mais de dois terços delas vão diretamente para ela, a inesquecível, a imortal, a esplendorosa: a Mona Lisa.

Ninguém precisa dizer o que é a Mona Lisa, certo? Só para ficar no florentino Giorgio Vasari, o renascentista que consolidou a versão de que era a mulher do comerciante Francesco del Giocondo e o primeiro a falar de seu sorriso misterioso. “Um sorriso tão agradável, mais divino que humano. A realidade não era mais viva”, escreveu. (Detalhe: Vasari não viu a obra-prima de Leonardo Da Vinci).

O crítico André Malraux dizia que os museus não se limitam a simplesmente exibir obras de arte, mas a criá-las. A Mona Lisa como a conhecemos – ou como não a conhecemos – não existiria sem o Louvre, provavelmente, e sem a mística que se criou em torno dela (não vou nem mencionar o papel que a tela tem no vagabundíssimo thriller O código da Vinci).

Tente vê-la de perto. Você compra o ingresso, desdobra o seu mapinha e vai direto para a sala onde ela está. Ao chegar, lá estão algumas dezenas de turistas, ansiosos como você. Só que eles chegaram na sua frente. Você espera aquele monte de cabeças sair e, finalmente, está cara a cara com a Gioconda. Nos pouquíssimos segundos diante do quadro, você tentará, ingenuamente, entender qual a razão desse frisson todo. Entre você e ela existe um vidro. Tem também aquela distância regulamentar e o bedel com cara de poucos amigos. Dá tempo de notar a sobrancelha quase inexistente da mulher. E também que…

… quando você acha que decifrou qualquer coisa, a leva seguinte de turistas japoneses já o atirou para longe, a sala está repleta e está na hora de completar a turnê de pagação de mico em Paris, com uma visita a uma das cinco filas para visitar a velha Torre Eiffell.

A Mona Lisa fica bem melhor naquele seu livro sobre as maiores obras-primas da humanidade, apreciada no conforto da sua sala em todo seu mistério e seu esplendor, sem ninguém por perto.

Bem que eu vi que tinha uma coisa estranha com ela