Era por volta das 15h na fronteira com o Peru, quando quatro homens encapuzados chegaram de barco e invadiram a aldeia Irari 2, do povo Kanamari, na terra indígena Vale do Javari. Armados com fuzis, perguntavam, em espanhol, pelo líder da comunidade. “Estavam pedindo a cabeça do cacique, falaram que queriam acertar as contas pessoalmente”, descreve o boletim de ocorrência. Os homens não encontraram a liderança e decidiram fugir.
A intenção dos criminosos era se vingar de uma ação de monitoramento feita no dia anterior pela Equipe de Vigilância da Univaja (EVU), ligada à União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja). A EVU encontrou toras de madeira nobre recém-desmatada às margens do igarapé Irari. Acionada pelos indígenas, a Polícia Federal (PL) contabilizou 150 metros cúbicos das espécies favoritas das madeireiras clandestinas locais.
Registrado em abril de 2023, o episódio de violência contra os Kanamari repete os mesmos fatores que levavam, há um ano, aos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips. Bruno atuava justamente na Equipe de Vigilância da Univaja. Dom escrevia um livro intitulado “Como Salvar a Amazônia”. A guerra pelos recursos naturais que tirou as vidas de ambos está em pleno curso e pode fazer novas vítimas a qualquer momento.
O Brasil de Fato voltou ao local das mortes de Bruno e Dom e conversou com os protagonistas de histórias da resistência indígena que marcam o Vale do Javari. Um ano se passou, mandantes e executores do crime foram presos, mas a demanda continua a mesma: mais presença do Estado para garantir os direitos constitucionais e as vidas dos indígenas, que relembram do indigenista com gratidão e saudosismo.
Na Funai, colegas de Bruno exaltam seu legado no indigenismo e, numa nova etapa de organização política e sindical, fazem o possível para que sua morte se traduza, pelo menos, na valorização da vida dos servidores. A família do indigenista vê no julgamento uma forma de defender seu legado. E uma das principais testemunhas do caso se diz abandonada e despreparada para enfrentar os advogados dos assassinos.
“Estamos tentando sobreviver”
Dias depois da grande apreensão de madeira viabilizada pela Univaja, madeireiros fizeram uma visita a Sabá (nome fictício). “Ele foi em casa porque achava que eu trabalhei na situação da apreensão, mas não faço mais isso. Apreenderam a arma desse madeireiro e ele foi em casa procurar essa arma”, narrou, sob anonimato, ao Brasil de Fato, após escapar ileso do episódio.
Uma das últimas pessoas a ver Bruno e Dom com vida, Sabá deixou a Equipe de Vigilância da Univaja após os homicídios. Quando soube que a dupla não tinha chegado ao destino, ajudou a procurar os corpos e identificou o local onde a embarcação deles se chocou, desgovernada, contra a vegetação da margem do rio. Agora, ele é uma das principais testemunhas da ação judicial que pode condenar os autores do crime e foi incluído em um programa de proteção a testemunhas.
“Eu sinto receio pela minha vida”, relatou. “Sempre senti desde que o fato [mortes de Bruno e Dom] aconteceu, desde o momento em que eu soube que eu seria um dos assassinados. A minha vida em si mudou toda a rotina, toda a minha liberdade que eu tinha. Fiquei como um prisioneiro. Até para achar um emprego é difícil. No município nem se fala de emprego. As cabeças maiores da Univaja estão em Brasília. E ninguém se preocupa com quem está aqui?”
Sabá diz que, “se a cabeça não fosse forte”, já teria sido paralisado por uma depressão. A única fonte de renda dele, da esposa e dos filhos é o Bolsa Família. No trabalho de monitoramento com a Univaja, diz nunca ter ganhado salário.
“Se o Bruno estivesse aqui, as coisas seriam diferentes. O Bruno nos acompanhava quando a gente estava em área. E mesmo à distância, ele se preocupava com o nosso dia-a-dia. Hoje eu vejo que ninguém se preocupa com nada. Ninguém quer saber se você está bem ou se você está mal”, desabafa Sabá.
Com dinheiro, ele diz que contrataria um segurança particular. Pelo menos para poder visitar a terra indígena, onde não é possível adentrar sem antes passar pelas comunidades de pescadores onde estão, segundo ele, pessoas que o querem morto. “Você não está seguro indo para a aldeia e nem dentro da cidade”.
“Tivemos toda essa grande força militar dentro do Javari durante a busca ativa dos corpos [de Bruno e Dom]. Mas infelizmente nós estamos hoje aqui tentando sobreviver, da mesma forma que estávamos tentando sobreviver antes [das mortes]. Eu faria tudo de novo, desde que junto com meus parentes”, afirma.
A reconciliação de Bruno com os Matis
Bruno Pereira não tinha uma boa relação com os Matis, uma das etnias que habitam o Vale do Javari. Quando o povo se envolveu em um conflito interétnico com indígenas isolados Korubo, a atuação de Bruno como coordenador regional da Funai foi considerada hostil pelos Matis. Em 2016, eles ocuparam a sede local do órgão indigenista até ouvirem a promessa de que Bruno seria exonerado.
“Mas ultimamente isso estava mudando”, relembra o presidente da Univaja, Bushe Matis. “Quando ele saiu da Funai e veio para o movimento indígena, ele estava tendo boa relação com a gente. Ele falava: ‘Bushe, bora voltar, eu quero trabalhar com vocês, fazer fiscalização. Bora no rio Branco ver aquelas invasões. Vamos montar equipe, logística’. Então nosso relacionamento estava reiniciando. E aí logo mataram ele”.
A prova definitiva da reconciliação veio na busca pelos corpos que se seguiu ao desaparecimento do jornalista e do indigenista. Pertences de Bruno que haviam sido ocultados mata adentro pelos assassinos – camisa, carteira de vacinação e uma lona, segundo Bushe – foram encontrados pelos Matis. Até hoje, a etnia se orgulha de ter dado uma contribuição decisiva ao desfecho de um dos períodos mais críticos do Vale do Javari.
“Nós, povo Matis, sentimos que o Bruno era um humano, uma pessoa. Tem família. A gente mobilizou a equipe de Matis no local para apoiar nas buscas. Eu era supervisor da Funai, então mobilizei e formei a equipe. Peguei o barco da Funai e fui in loco. Somamos com a equipe da Univaja que estava lá. Nós, Matis, fizemos muito trabalho voltado ao resgate, na tentativa de procurar. Então foi o povo Matis que achou os vestígios, materiais e objetos do Bruno”, conta Bushe.
“Estado mudou discurso, mas continua ausente”
Bushe Matis diz que a tragédia potencializou a determinação dos líderes que compõem a Univaja. Em Brasília (DF), um núcleo do qual fazem parte o procurador jurídico da organização, Eliésio Marubo, e Beto Marubo, faz a interlocução com políticos, autoridades e apoiadores.
Em Atalaia do Norte (AM), onde está a sede da Univaja, a Equipe de Vigilância é assessorada pelos indigenistas Carlos Travassos e Orlando Possuelo, ambos com longa experiência na região. Outra prioridade é a revitalização dos limites da terra indígena, com a limpeza da vegetação. É uma forma de invasores identificarem com mais clareza os marcos que foram colocados na época da demarcação.
“A Univaja está ainda mais atuante. Agora temos equipes treinadas. Carlos [Travassos] veio e contratamos um cara especializado em treinamento na vida selvagem. Então está evoluindo. Nunca parou, na verdade. Agora a gente continua esse trabalho em parceria com Ibama, Polícia Federal e articulações em nível nacional. A gente regulamentou a vigilância com as autoridades, porque não somos milícia. PF e MPF já nos acompanham”, descreve o presidente Bushe Matis.
Mas o respaldo dos órgãos federais à atuação da Univaja não significa que autoridades estejam presentes de forma permanente no território. No caso dos madeireiros armados que invadiram a aldeia Kanamari em abril deste ano em represália a uma apreensão madeira, a Associação dos Kanamari (Akavaja) encaminhou à Funai pedido formal de que PF e Ibama se deslocassem para lá imediatamente. Mas nada aconteceu, segundo o presidente da Akavaja, Delcimar Tamakuri Kanamary.
“Já são inúmeras denúncias feitas pela Associação e lideranças sobre as ameaças, ataques e o clima de insegurança total que o povo Kanamari passa”, diz trecho da denúncia encaminhada pelos Kanamari à Funai. “A morosidade do Estado tem nos causados grandes perdas e não estamos dispostos a perder mais nenhum dos nossos”. “A retirada de madeira e a pesca ilegal feita por criminosos, dentro das nossas aldeias, têm nos tornado reféns do medo”, diz o documento.
O presidente da Univaja reclama os pedidos de ajuda não são atendidos. Ele também relata não ter havido avanços nos projetos de pesca sustentável, que poderiam ajudar a garantir renda para ribeirinhos e afastá-los das atividades predatórias dentro da terra indígena. A última parada de Bruno e Dom antes de morrer foi na comunidade ribeirinha São Rafael. O objetivo era encontrar um líder comunitário para implementar a pesca legal de pirarucu.
“A atuação do Estado continua a mesma. Não melhorou, nunca vai melhorar. A Funai segue sucateada, sem orçamento. E imagina a presença da Polícia Federal, Ibama, Exército e Força Nacional? Não vai ter. Porque eles trabalham com diária, não ficam aqui. Essa parte do Estado é ausente. Mas a Funai sempre está lá – só a Funai – tentando fazer alguma coisa. Funai está presente, mas sem fiscalização, sem monitoramento, não tem equipe, não tem logística, não tem estrutura”, critica o líder Matis.
Em fevereiro deste ano, uma comitiva do governo com ministros de Estado foi ao Vale do Javari. Na encontro, organizado em parceria com a Univaja, a presidenta da Funai, Joenia Wapichana, fez uma retratação pública a respeito da conduta do órgão indigenista durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que responsabilizou de forma difamatória Bruno e Dom pelas próprias mortes.
Em março de 2023, foi a vez da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, visitar o território, onde prometeu retomar o julgamento do marco temporal das terras indígenas. Ainda no ano passado, uma comissão temporária do Senado voltada a encontrar soluções para o Vale do Javari recomendou a presença das Forças Armadas na região.
“O discurso das autoridades é muito vazio”, enfatiza o presidente da Univaja. “Só fala, faz a manifestação e diz que vai ajudar. Vieram aqui na visita interministerial aqui no Vale do Javari. Se reuniram na sede da Univaja e prometeram fazer alguma coisa. E até agora não aconteceu quase nada. Não tem presença da Polícia Federal, nem Ibama, nem Exército, nem Força Nacional, que possam estar aqui atuando no Vale do Javari. Não existe”.
O trabalho da EVU e as estratégias dos pescadores
Ao fim de uma jornada de pesca ilegal no interior da terra indígena Vale do Javari, dois pescadores se deparam com o imponente posto da Funai na junção dos rios Itacoaí e Ituí, que marca o limite da área protegida. É de noite, e eles tentarão passar pela fiscalização com a carga proibida.
A dupla acomoda o peixe ilegal no chão da embarcação, que é quase totalmente preenchida de água do rio. Se a água for pouca, a canoa não afundará o suficiente para passar despercebida. Se for muita, o peso vai fazer o barco submergir completamente, e a carga será perdida.
Quando o refletor da torre de fiscalização se apaga por alguns minutos, eles iniciam uma travessia discreta para fora da terra indígena, conduzindo a carga pelo rio e suportando o incômodo de peixes que roem a pele dos pés.
A descrição foi feita ao Brasil de Fato por um pescador que conhece essa e outras técnicas aperfeiçoadas ao longo de décadas pelos invasores no Vale do Javari. Eram essas práticas que a Equipe de Vigilância da Univaja (EVU), com Bruno Pereira e Sabá (nome fictício) procuravam registrar e denunciar.
“Em frente à base da Funai tem milhares de caminhos por terra usados por pescadores”, explica Sabá. “Eles vão carregando no braço as canoas pequenas. Outros já têm canoa dentro da terra indígena. Então só entram com o necessário para pescar e já saem com o produto. Esse era o ponto focal da gente [na EVU]. Marcar e identificar para que nós tivéssemos em mãos anotações concretas para levar para a Polícia Federal”.
A metodologia da EVU havia sido desenvolvida por Bruno em conjunto com os indígenas. O objetivo era monitorar a entrada e saída de invasores e treinar o maior número possível de indígenas aldeados para que fizessem o mesmo trabalho de forma autônoma. Bruno e Sabá achavam que o trabalho logo renderia bons frutos.
“Eu treinava os parentes para usar GPS, fotografia e filmagem. Naquela época cada entrada da EVU [na terra indígena] durava 28 ou 30 dias. Eu fiz duas entradas. Como eu tenho um ‘desenrolado’ com os povos das aldeias, Bruno me chamou para tentar passar para os parentes como se faz uma leitura de mapa, marcar um ponto com GPS, como trabalhar com o Spot [localizador satelital]. E no futuro iria treinar os indígenas para que eles conseguissem atuar sem que a gente tivesse lá junto com eles”, conta.
Falta de assistência jurídica pode prejudicar julgamento, teme testemunha
No dia seguinte ao desaparecimento de Bruno e Dom, 6 de junho de 2022, Sabá afirmou ao Brasil de Fato que desconfiava de Amarildo Oliveira (Pelado), pescador que hoje respondeu por ter atirado na dupla. Além dele, sentam no banco dos réus o irmão de Amarildo, Oseney de Oliveira (Dos Santos) e Jefferson da Silva Lima (Pelado da Dinha).
“Nem a Univaja nem ninguém mandou advogado para nós nesse processo. Enquanto os assassinos estão cheios de advogados, a gente não tem sequer uma instrução de alguém que pelo menos estudou um ano de direito. Então isso pode prejudicar a gente de fazer justiça. De vez em quando penso se não tem uma forma de a gente sair, escapar desse processo”, diz a testemunha.
O nome de Ruben Dario da Silva Villar (Colômbia), apontado pela Polícia Federal como mandante das mortes, também foi mencionado por Sabá ao Brasil de Fato logo após o crime. A versão dos acontecimentos dada pelo ex-colega de Bruno à reportagem se manteve a mesma desde então e agora é peça chave para o Ministério Público Federal (MPF) conseguir a condenação dos assassinos.
“Os acusados, sim, estão cheios de advogados. No momento em que eles questionarem uma testemunha despreparada, sem nenhum acompanhamento de advogado, eles podem distorcer a fala dessa testemunha. Pode ser que algum advogado possa até acusar uma testemunha dessas de ter falhas contraditórias. Então isso pode trazer prejuízo a essas pessoas”.
Procurada pela reportagem, a procuradoria jurídica da Univaja respondeu que o papel de orientar testemunhas é das partes do processo. Eliesio Marubo, advogado da organização indígena, também disse esperar que as autoridades brasileiras “levem a sério esse tema e garanta a efetiva proteção do território e às pessoas ameaçadas”. “Não temos tido receptividade dessa pauta no governo federal”, declarou.
Além de Sabá, pelo menos outras três testemunhas da acusação depõem ao juiz federal Adriano Verli, no processo que tramita na Vara Federal Cível e Criminal de Tabatinga (AM).
Desfecho judicial deve ocorrer em um ano
No time de advogados que defendem os assassinos de Bruno e Dom, o mais experiente é Américo Leal, que representou o fazendeiro que mandou matar a missionária norte-americana Dorothy Stang, no Pará. Seu cliente, o pescador Amarildo (Pelado) havia confessado à Polícia Federal ter disparado os tiros contra Bruno e Dom. Depois, indicou aos policiais o local onde os corpos foram encontrados queimados, esquartejados e enterrados na mata, a três quilômetros da margem do rio Itacoaí.
Em maio, a reviravolta: Amarildo e os outros acusados voltaram atrás e alegaram legítima defesa. Eles passaram a dizer que Bruno teria atirado primeiro. João Bechega, advogado da família de Bruno e assistente de acusação no processo, diz que as alegações não são sustentadas em fatos.
“Há relatos de diversas pessoas que são capazes de fornecer um contexto da motivação do crime. O barco no qual Bruno e Dom se encontravam foi seguido e perseguido pelos réus. Já está comprovado que o primeiro disparo atingiu Bruno pelas costas durante a perseguição no rio. Além de toda a reconstituição dos fatos, que foi possível graças à confissão dos acusados. Na minha opinião, a tese da defesa é bastante frágil quando contrastada com outros elementos probatórios”, ponderou Bechega.
Em decisão recente favorável aos réus, um habeas corpus garantiu que parte dos depoimentos fosse anulada, atrasando o desfecho do caso e possibilitando que os acusados refaçam os depoimentos. Outros atrasos se deram por falhas na conexão de internet onde os pescadores estão presos.
“Eu entendo a preocupação das pessoas e a ansiedade que quem acompanha o caso pode ter, mas é importante também considerar que o judiciário tem limites na sua atuação. Nem sempre o ritmo é o esperado por todos, mas o andamento processual está, de certa forma, rápido dentro dos padrões brasileiros”, esclarece Bechega.
Para o assistente de acusação, os percalços não impedirão que seja feita justiça. O próximo grande passo no julgamento é o juiz definir se os réus vão ou não a júri popular. Na estimativa de Bechega, a definição deve vir dentro de um ano.
“A responsabilização dos indivíduos que cometeram esse crime bárbaro é a função primordial e única dessa ação penal. Agora, obviamente, uma condução correta, do ponto de vista da instituição processual e da responsabilização adequada pelos dois homicídios, está inserida em um contexto maior. Um contexto de respeito ao legado profissional, tanto do Bruno como do Dom”, assinala o advogado.
Justiça passa por responsabilização da gestão Bolsonaro
Entre os servidores da Funai colegas de Bruno, fazer justiça por Bruno e Dom passa por responsabilizar o ex-presidente da Funai, Marcelo Xavier. Ele foi indiciado pela Polícia Federal (PF) por dolo eventual – quando alguém assume o risco de matar – no duplo homicídio, acusação negada por Xavier. Em nota, a PF disse que Xavier tomou conhecimento, em 2019, do “risco de vida dos servidores do órgão e não adotaram as providências necessárias para a proteção dos funcionários”.
Servidor da Funai, Bruno foi demitido em 2019 pelo então ministro Sergio Moro de uma diretoria da Funai em Brasília logo após coordenar uma operação contra o garimpo ilegal no Vale do Javari. Sem respaldo dos seus superiores, ele se licenciou do órgão indigenista para trabalhar diretamente para a Univaja. Desde aquela época, ele recebia ameaças de morte.
“O Bruno personificou todo esse compromisso que o servidor da Funai tem com os povos indígenas”, disse ao podcast Bem Viver a indigenista da Funai e sindicalista Mônica Carneiro. “Os assassinatos aconteceram num período em que a gente vivenciava um clima de assédio institucional e perseguição tremendos. Estávamos sendo forçados a prevaricar, porque a gestão era anti-indígena”, relata a servidora.
No último ano, Mônica diz que houve um salto na luta política dos trabalhadores da Funai, motivado pela tragédia no Vale do Javari. Greves e protestos de servidores do órgão pressionaram o governo Bolsonaro e buscaram garantir mais segurança e melhores condições de trabalho, inclusive para os profissionais que deram sequência ao trabalho de Bruno na região.
“Nossa greve depois dos assassinatos foi uma greve de dor e desespero. A gente falou: ‘basta, a gente está morrendo. Isso não pode acontecer. Para muitos servidores, a profissão é também uma missão de vida. E a abnegação do Bruno representa isso muito bem”, diz Mônica, emocionada.
Outro lado
O Brasil de Fato procurou o escritório do advogado Américo Leal, que defende os acusados de matar Bruno e Dom. Um assistente do advogado chegou a marcar uma entrevista, mas as ligações não foram atendidas no horário combinado. O espaço segue aberto à manifestação.
O governo federal informou por nota que, às vésperas do primeiro aniversário das mortes de Bruno e Dom, o Ministério dos Povos Indígenas criou um grupo de trabalho para promover a segurança e combater a criminalidade no Vale do Javari. O grupo será formado por dez ministérios, que trabalharão em parceria com movimento indígena, Funai e Ibama.
A função do grupo será “propor medidas concretas para combater a violência e garantir a segurança territorial dos povos indígenas que vivem na área”. “As medidas em discussão pretendem abranger tanto a prevenção de crimes na terra indígena como facilitar a expulsão de invasores na região”, acrescenta o governo federal.