O turismo global enfrenta um novo desafio: o impacto do excesso de turistas nas cidades mais visitadas. Destinos populares como Barcelona, Veneza, Lisboa e Nova York estão implementando medidas para regular o fluxo de visitantes e mitigar problemas como a alta dos preços de aluguel e a falta de moradias acessíveis para os residentes locais.
No epicentro dessa discussão está o aluguel de curta temporada, facilitado por plataformas como Airbnb e Booking.com. Milhares de manifestantes em Barcelona protestaram contra o turismo excessivo, utilizando pistolas de água contra os visitantes.
A prefeitura de Barcelona anunciou que, até 2028, proibirá as plataformas de aluguel de curta duração para turistas, tais como o AirBnb, impactando cerca de 10 mil imóveis. “O preço médio do aluguel subiu 68% em dez anos, muito acima da inflação e do aumento da renda de trabalhadores e pensionistas”, afirmou o prefeito Jaume Collboni.
Além dos impactos econômicos, há preocupações sobre o transporte público e o comportamento dos turistas. Mateu Hernández, diretor-geral de Turismo de Barcelona, disse ao Financial Times que a cidade não quer turistas que fazem o que é proibido em seus países.
Em meio à alta temporada do turismo na Europa, um grupo de manifestantes de Barcelona atirou água para espantar os visitantes da cidade. Aos gritos de "turistas, vão para casa" e "Barcelona não está à venda", os manifestantes passaram a mensagem de que a cidade está se tornando… pic.twitter.com/LB2kEuDnby
— Folha de S.Paulo (@folha) July 12, 2024
“O governo espanhol e o de Barcelona incentivaram o turismo como força econômica, mas não previam a tecnologia disruptiva que impulsiona o movimento de visitantes e traz problemas à população”, disse André Coelho, especialista em Turismo da FGV Projetos em entrevista ao Globo.
A gentrificação, ou transformação de áreas com a chegada de pessoas de maior renda, contribui para a chamada “turismofobia”. “O turista vem aproveitar a cidade e o morador tem de sair. No Brasil, por ora, temos questões sociais mais graves para resolver, mas é preciso pensar o turismo conectado a seus efeitos”, alertou Coelho.
Em 2023, Barcelona, com uma população de 1,7 milhão, recebeu mais de 16 milhões de visitantes. Outras cidades, como Veneza, Florença, Lisboa, Berlim e Nova York, também adotaram medidas para regular o aluguel de curta duração. Nova York, por exemplo, proibiu o aluguel de menos de 30 dias desde setembro, permitindo-o apenas se o anfitrião morar no imóvel durante a estadia e pagar uma taxa a cada dois anos.
O Airbnb contestou a decisão judicialmente, revelando uma receita líquida de US$ 85 milhões na cidade em 2022. No Brasil, o aluguel de curta duração via plataformas digitais também enfrenta desafios legais, como a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que proíbe essa atividade em condomínios com uso exclusivamente residencial, a menos que os condôminos decidam permitir.
A recente aprovação do novo Plano Diretor de São Paulo retirou um benefício fiscal para imóveis voltados ao aluguel de curta duração. Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos de Construção do FGV Ibre, destacou a importância da regulação: “A regulação é fundamental, monitorar para onde cresce o mercado imobiliário também. É preciso regular, mas não a ponto de desincentivar a iniciativa privada a construir.”
O Airbnb afirmou que o aluguel por temporada no Brasil é legal e que proibi-lo violaria o direito constitucional de propriedade. A Booking.com informou que opera conforme as legislações de cada mercado e está monitorando discussões sobre aluguéis de curta temporada ao redor do mundo.
Cada cidade tem suas próprias restrições para lidar com o problema. Lisboa, por exemplo, suspendeu novas licenças temporariamente e está implementando medidas para limitar os aluguéis existentes e aliviar a crise de moradia local.