A novela da tentativa de acordo para indenizar os familiares e vítimas do incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo, no Ninho do Urubu, no Rio de Janeiro, ganhou mais um capítulo, na quarta feira, 20, com a decisão do Ministério Público estadual de pedir a interdição imediata do local e o bloqueio de R$ 57,5 milhões das conta do rubro negro carioca.
Na petição, encaminhada ao Juizado Adjunto do Torcedor e dos Grandes Evento, o MP aponta “a omissão do clube, aliada ao grave acidente ocorrido, demonstra um desrespeito reiterado às determinações de interdição das referidas instalações.”
Como se sabe, no incêndio ocorrido no dia 8 de fevereiro, morreram dez jogadores da base do Flamengo, alojados no CT que não contava com alvará de funcionamento emitido pelo Corpo de Bombeiros.
O pedido de bloqueio judicial das contas do clube, uma salvaguarda das autoridades para o ressarcimento das indenizações devidas aos familiares dos atletas vitimados no incêndio, é uma decorrência do impasse nas negociações com a diretoria do Flamengo quanto aos valores devidos.
A diferença entre a proposta apresentada pela Câmara de Conciliação, formada pelo MP-RJ, Defensoria Pública e Ministério Público do Trabalho e a do Flamengo é abissal.
A Câmara de Conciliação propôs o pagamento de R$ 2 milhões para cada família, além de uma pensão mensal de R$10 mil, até a data em que as vítimas completassem 45 anos. Já o clube ofereceu um pagamento imediato entre R$ 300 mil e R$ 400 mil por atleta e um auxílio equivalente a um salário mínimo por mês, durante 10 anos.
Na ponta do lápis, a proposta da Câmara totalizaria, a grosso modo, R$ 56 milhões ao longo dos próximos 30 anos, já que os jogadores falecidos estavam na faixa etária dos 15 anos por ocasião ao incêndio. Por seu turno, a do Flamengo, soma algo em torno de R$ R$ 5,2 milhões, menos de 10% da apresentada pelas autoridades.
À primeira vista, enquanto o oferecido pelo Flamengo beira a mesquinharia, diante da dimensão da tragédia, a da Câmara pode parecer excessiva, como se tivesse sido elaborada por um punhado de vascaínos, botafoguenses e tricolores para inviabilizar o time de futebol mais popular do País.
Mas não é. Por mais que os valores sugeridos pela Câmara de Conciliação sejam elevados, eles são perfeitamente suportáveis pelo clube, cuja fatia de responsabilidade pela tragédia não é desprezível.
Dono do maior orçamento do futebol brasileiro, com uma previsão de receita bruta de R$ 765 milhões, em 2019( o segundo é o Palmeiras, com R$ 591 milhões), o Flamengo é uma máquina de fazer dinheiro.
Dessa quantia, a previsão oficial é de que nada menos de R$ 236 milhões deverão ter origem na transferência de jogadores, a maior parte deles formados nas categorias de base.
É o caso, por exemplo, de craques como Lucas Paquetá, vendido ao italiano Milan, de Turim, por R$ 150 milhões. Paquetá repete a trajetória do jovem Vinicius, que custou ao espanhol Real Madrid R$ 165 milhões, no ano passado.
Em contrapartida, o custo das categorias de base, beira o ridículo diante das receitas geradas nas vendas de jogadores e na comparação com o desembolsado por outros clubes de primeira linha.
Como mostra uma reportagem do Estado de S. Paulo, na temporada de 2017, esse custo atingiu um total de R$ 23,8 milhões, de acordo com o balanço do Flamengo, menos da metade dos R$ 48,6 milhões investidos pelo Corinthians com sua base.
Portanto, dinheiro para mitigar o sofrimento das famílias de seus jovens talentos, cujas mortes significam o fim do sonho de uma vida melhor, não falta.
Abre a mão, Mengão.