Vivendas da Barra: vídeo de Carlos indica acesso remoto aos áudios

Atualizado em 9 de novembro de 2019 às 19:34
Portaria do condomínio Vivendas da Barra. Foto: Reprodução

Publicado originalmente no Comeananas.

“Eu tô aqui na administração do condomínio do meu pai, o presidente Jair Bolsonaro, tendo acesso ao programa de gravação de voz que identifica pra que casa a portaria ligou e o horário que ligou”, disse Carlos Bolsonaro no vídeo em que pretendeu provar que Élcio de Queiroz foi autorizado por Ronnie Lessa, e não por “Seu Jair”, a entrar no Vivendas da Barra no dia 14 de março de 2018, horas antes do duplo assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes.

O noticiário desta sexta-feira, 8, deu conta de que a polícia finalmente recolheu o computador da administração do condomínio.

A tela aberta do Windows Explorer mostrada por Carlos, porém, indica que o computador da administração do condomínio Vivendas da Barra pode não ser a única máquina capaz de acessar os registros de áudio da portaria. Isso porque, nos vídeos de Carlos, o “caminho” da pasta onde os arquivos aparecem armazenados aponta para a possibilidade de esses arquivos estarem em uma partição do Windows configurada para permitir acesso remoto, ou seja, um drive compartilhado entre dois ou mais computadores.

‘Misterioso drive Z:’

Os áudios do sistema de interfone do Vivendas da Barra aparecem no vídeo de Carlos arquivados num diretório chamado “gravações” com o “caminho” (\\USER-PC) (Z:), e com um ícone de “Este Computador” (“This PC”).

Uma pesquisa na internet mostra que um drive “Z:” costuma aparecer no Windows de três maneiras mais comuns. A primeira é quando se quer formatar o computador e cria-se uma unidade “Z:” para armazenar a “imagem” do sistema operacional a fim de reinstalá-lo após a formatação, sem necessidade de um CD. A segunda maneira é quando acontece a instalação de uma atualização do Windows. Há casos em que usuários relatam o aparecimento, após o processo, de um “misterioso drive Z:”, que, neste caso, sequer pode ser acessado, muito menos usado para armazenar arquivos.

Estas, portanto, não são as explicações prováveis para a existência do diretório “Z:” onde Carlos acessa os arquivos de áudio do Vivendas da Barra. A explicação provável é que o diretório “gravações (\\USER-PC) (Z:)” seja uma unidade de rede mapeada.

Uma unidade de rede é uma unidade ou pasta compartilhada entre uma rede de computadores – rede acessível por senha – e com seus dados eventualmente editáveis, dependendo do nível de permissão. Costuma-se mapear uma unidade de rede quando seu uso é frequente, para facilitar o acesso a ela.

Nas palavras da própria Microsoft, “mapeie uma unidade de rede para acessá-la no Explorador de Arquivos do Windows sem precisar procurá-la ou digitar seu endereço de rede toda vez”. O mapeamento cria uma espécie de “atalho” para a unidade ou pasta no Windows Explorer. Na ferramenta nativa do Windows para mapear uma unidade de rede, a letra que aparece por padrão para a criação do “atalho” é a letra Z.

Quem configuraria um atalho de uso frequente para os registros de áudio da portaria de um condomínio?

Élcio, John, Sergio

Sendo mesmo um diretório passível de “conversa” entre dois ou mais computadores – batida que só mesmo o martelo de uma perícia a sério poderia dar -, o “gravações (\\USER-PC) (Z:)” aberto por Carlos Bolsonaro pode, por exemplo, ser compartilhado só entre a administração do Vivendas da Barra e a portaria do Vivendas da Barra; pode, ainda, ser compartilhado por todos os condôminos, tipo “política do condomínio”, ainda que seja difícil imaginar um motivo para isso; pode ter sido compartilhado apenas com a família Bolsonaro (“pegamos lá toda a memória da secretária eletrônica que é guardada há mais de ano“), e os motivos imagináveis para isso estão no noticiário, no que seria um moderno caso de obstrução colaborativa da justiça.

Em todas as hipóteses, o computador da sala da administração do condomínio Vivendas da Barra não seria a única máquina onde é possível acessar os arquivos de áudio da portaria por onde já entraram de Élcio de Queiroz a John Bolton, passando por Sergio Moro, quando foi aceitar o cargo de ministro da… Justiça.

Não é o único local, de qualquer maneira, tendo em vista a confissão de Jair Bolsonaro.