Xenofobia, racismo e homofobia: Mbappé dribla os preconceitos como se fossem zagueiros

Atualizado em 14 de dezembro de 2022 às 14:24
Kyllian Mbappé, o artilheiro da Copa do Catar. Getty Images

Poucos países do mundo do futebol são tão beneficiários de seus imigrantes quanto a França. Participante de quatorze das vinte edições do torneio, alguns dos principais jogadores dos selecionados franceses ou são filhos de estrangeiros, principalmente de africanos, ou são eles próprios nascidos em outros países.

Just Fontaine, até hoje maior artilheiro da história das Copas, com 13 gols na Copa da Suécia, em 1958, é nascido no Marrocos, adversário de hoje dos franceses no jogo que será realizado às 16h (horário de Brasília) no estádio Al Bayt.

Jean Tigana, um dos principais parceiros de Michel Platini na seleção francesa dos anos 80, nasceu no Mali e contribuiu para que aquela geração chegasse a duas semifinais seguidas do principal torneio da Fifa: até então, a quarta colocação na Espanha em 1982 e a terceira no México em 1986 tinham sido as melhores posições do país.

Em 1998, com mais imigrantes, o ápice: com Thuram, nascido na ilha caribenha de Guadalupe, o ganês Desailly, o senegalês Patrick Vieira e, principalmente, o franco-argelino Zinédine Yazid Zidane, a França conquistava em casa o título mundial, no famigerado jogo em que uma convulsão tida por Ronaldo Fenômeno abalou o psicológico da seleção brasileira, que perdeu a decisão por 3 a 0.

A seleção francesa, campeã mundial de 1998, uma das mais miscigenadas de todos os tempos. Reprodução

Foi em dezembro daquele mesmo ano que nasceu Kylian Sanmi Mbappé Lottin, filho de um técnico de futebol camaronês com uma ex-jogadora de handebol de origem argelina.

De origem humilde, ele cresceu na comuna de Bondy, na periferia de Paris. Esse fato é um elemento formador de sua personalidade. Em artigo no Player’s Tribune, escreveu:

“Nosso bairro é um caldeirão incrível de culturas diferentes — francesa, africana, asiática, árabe, de todas as partes do mundo. Pessoas de fora da França sempre falam sobre a periferia sob uma ótica ruim, mas, se você não é daqui, você pode não entender realmente como é. As pessoas falam sobre “bandidos”, como se fossem inventados aqui. Mas existem bandidos em todo o mundo. Existem pessoas que estão lutando em todo o mundo. A realidade é que, quando eu era criança, costumava ver alguns dos caras mais durões da vizinhança carregando mantimentos para minha avó. Você nunca vê esse lado da nossa cultura nas notícias. Você só ouve falar do mal, nunca do bom. (…)

Às vezes as pessoas me perguntam por que há tanto talento vindo de nossos bairros. Tipo, talvez haja algo na água, ou a gente pudesse estar treinando de uma forma diferente, como Barcelona ou algo assim. Mas não, se você vai no AS Bondy, vai encontrar apenas um clube familiar humilde. Alguns prédios antigos e um gramado sintético. Mas acho que o futebol é diferente para nós. É essencial. É todo dia. É como pão e água.”

Mbappé, ainda criança, o último sentado, à direita. Arquivo Pessoal

Após uma passagem pelo centro de formação de Clairefontaine, por onde também passaram nomes como Zidane e Giroud, aos 16 anos Mbappé foi contratado pelo Monaco, clube pelo qual foi campeão da temporada 2016/2017 e conquistou ainda o prêmio de Melhor Jogador Jovem do Campeonato Francês e o prêmio Golden Boy, dado ao melhor jogador com idade abaixo de 21 anos atuando na Europa.

Em 2017 foi contratado pelo Paris Saint-Germain, time pelo qual joga até hoje e tem como companheiros Neymar e Messi.  No ano seguinte, foi o principal jogador da Copa da Rússia e viria a se tornar o primeiro jogador com menos de 20 anos a marcar um gol em uma final depois de Pelé, 60 anos depois.

Após perder um pênalti que resultou na eliminação dos Les Bleus para a Suíça, nas oitavas de final da Eurocopa de 2020, Mbappé cogitou deixar de defender a seleção francesa em razão das críticas racistas que recebeu.

“Eu disse: ‘Não posso jogar para pessoas que pensam que sou um macaco’. Eu não vou jogar”, contou o jogador à Sports Illustrated.”Mas depois, tive uma reflexão com todas as pessoas que estão ao meu redor e torcem por mim, e acho que não foi uma boa mensagem desitir. Sou um exemplo para todos. Essa é a nova França. É por isso que não abri mão da seleção, pois é uma mensagem para a geração jovem: ‘Somos mais fortes do que isso'”.

A decisão foi um alívio a todos que gostam de futebol. Atacante rápido e letal, tem na velocidade, no drible e na capacidade de finalização suas principais características. No Catar, já marcou 5 gols e está empatado com seu colega de PSG, Lionel Messi, na artilharia.

A vida afetiva do atleta vem sendo objeto de especulação. Visto junto com a modelo trans Ines Rau em um passeio em seu iate e no Festival de Cinema de Cannes, a imprensa europeia vem divulgando que ela seria sua namorada.  Discreto, o jogador não confirma, mas também não desmente.

Mbappé em seu iate com a modelo trans Ines Rau. Reprodução

A modelo francesa, de ascendência argelina, fez a cirurgia de transição de gênero aos 16 anos, mas somente aos 27 assumiu a transição.

Abaixo, um vídeo que mostra o porquê de Mbappé é considerado um dos melhores jogadores do mundo na atualidade:

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